Mania de perseguição
RIO DE JANEIRO - De uns tempos para cá ocorre comigo um fato curioso: encontrar amigos ou conhecidos nas mais disparatadas ocasiões e nos mais inusitados lugares. Como que um Frestão me acompanha os passos, transformando carregadores de aeroportos em ministros de Estado, motoristas em poetas, camelôs em colunistas sociais.Isso vem de repente. E dou de cara, por exemplo, com o Ferreira Gullar, descabelado e magro como o próprio, vendendo boletos de metrô em Buenos Aires. Aliás, em recente estada na capital argentina, tive um infindável e divertido desfile de amigos ou conhecidos que me acompanhavam pelas calles e me aliviavam a solidão.
Vi Ruy Castro passar de moto pela avenida de Maio; vi José Wilker fazendo empanadas numa empanaderia de Lavalle. Paulo Coelho era um cidadão calmo na fila de ônibus de Corrientes e Marcos Vinicios Vilaça tocava bandoneon numa orquestra de "moços cantores" da calle Maipu.
Dei de cara com Angeli de cicerone com Ziraldo. Era uma gentil mistura de Genoino, Maluf e Joaquim Barbosa. O Silvio Santos vendia fiambres na esquina de Tucumã com San Martin.
Vi o mestre Evanildo Bechara metido numa farda de suboficial da impávida guarda bonaerense, com apito, revólver, botas, esporas.
-- Mestre, o que faz aqui com este uniforme?
O mestre ordenou: "Circule, señor, circule!"
Quis abraçá-lo, ele meteu o apito na boca. Apareceram soldados. Pedi desculpas num dialeto em que entraram os poucos e mal sabidos idiomas que conheço e, antes que o negócio engrossasse, entrei num teatro.
Ao olhar para o palco, estanco lívido: no tablado fazendo um barulho infernal com os tacões dos sapatos, quebrando castanholas com os braços em arco, de costeletas fatais, olhar duro de quem enfrenta um touro --o nosso recente cardeal Tempesta dançava um fandango!
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