quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Ricardo Balthazar

folha de são paulo
Não é com ele
SÃO PAULO - Diante das investigações sobre o cartel de empresas que se uniu para fraudar licitações de trens nas administrações do PSDB em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin comporta-se às vezes como se o assunto não fosse com ele.
Em outubro, ele apareceu falando grosso em anúncio veiculado por seu partido na televisão. "Nós queremos toda a verdade, somos o maior interessado nisso", disse. "Vou fundo nessa história, punir os culpados."
Três dias depois, a Corregedoria do Estado recomendou à Secretaria de Planejamento que demitisse imediatamente um funcionário sob investigação por causa de suas ligações com a turma do cartel, Pedro Benvenuto.
Passados dois meses, o próprio Benvenuto decidiu entregar na semana passada o cargo que ocupava, como a Folha informou ontem. A Secretaria do Planejamento afirma que ainda estava estudando o que fazer com o caso quando foi surpreendida pela decisão de Benvenuto.
Não é fácil para Alckmin olhar para o outro lado. Dois auxiliares de sua confiança, o chefe da Casa Civil, Edson Aparecido, e o secretário de Desenvolvimento Econômico, Rodrigo Garcia, foram acusados de receber propina para facilitar negócios do cartel com o governo estadual.
Alckmin decidiu mantê-los, por uma razão simples. Tudo que apareceu contra eles até aqui é a palavra de um ex-diretor da Siemens que tem amigos no PT e resolveu cooperar com o Ministério Público e a Polícia Federal. O governador sabe dos riscos que corre. Se as investigações avançarem no ano em que ele estará em busca da reeleição, mais revelações poderão lhe causar enorme embaraço.
Alckmin enfrentará uma eleição difícil em 2014. Ele acha que terá um trunfo se conseguir preservar a imagem de bom moço e administrador austero que os eleitores costumam associar a ele. Pode ser. Mas muito dependerá do andamento das investigações sobre o cartel, uma variável hoje completamente fora do controle do governador.

    Janaina Conceição Paschoal

    folha de são paulo
    Corrupção mata
    A corrupção está diretamente relacionada a prédios que desabam, a estabelecimentos que queimam, a instituições sem equipe técnica adequada
    Muitos escândalos envolvendo corrupção têm surgido. Com eles, o pleito de elevação de pena e endurecimento na execução das punições. É importante que se saiba que, comparativamente, o Brasil não tem uma legislação branda com relação à matéria. Talvez não seja de novas leis que careçamos. Parte do enfrentamento do problema passa por um exercício de alteridade, de colocar-se no lugar do outro.
    Todos têm algum tipo de condescendência. Já ouvi pessoas muito respeitáveis dizerem que a corrupção é inerente ao ser humano e que, na verdade, somente se negocia o que é menos importante. Por esse raciocínio, a corrupção não ocorreria em situações sérias.
    Assim, pagar por um alvará de funcionamento, ou por um laudo referente a uma infração leve, pode parecer algo banal. No entanto, aquilo que é sério para Pedro, não é para Paulo.
    Penso que o melhor caminho para solucionar a situação calamitosa em que nos encontramos seria estimular agentes públicos e privados a pensarem nos seres que mais amam sempre que forem convidados à corrupção, seja pagando, seja recebendo.
    Explico: o funcionário público que vai receber para, por exemplo, favorecer um investigado, ou acusado, em crime sem violência, deve pensar que, futuramente, um seu colega pode também receber em caso que envolva seu filho como vítima.
    Igualmente, um empresário que decide pagar pela emissão de um laudo ou certidão deverá pensar que o proprietário da escolinha frequentada por sua pequena filha provavelmente achará razoável (e pouco sério) comprar os alvarás necessários ao funcionamento.
    Sempre lembro o depoimento de um policial que, depois de apreender um caminhão de drogas, negou-se a receber propina para liberar os envolvidos e a carga. Ele poderia ter ficado rico, mas pensou na filha e em como se sentiria se ela fosse vitimada pelas drogas ao chegar à adolescência. Pena nenhuma tem maior força que essa reflexão.
    Os acidentes existem. Mas não há como deixar de reconhecer que a corrupção está diretamente relacionada aos prédios que desabam, aos estabelecimentos que queimam, às instituições que funcionam sem equipe técnica adequada.
    Essas observações não têm finalidade penal, ou seja, não se está advogando que corrompidos e corruptores sejam punidos por homicídios, em uma ginástica interpretativa que coloca em risco o Estado democrático de Direito. Está-se apenas convidando cada indivíduo a pensar que os escombros e o fogo podem atingir seu pai, seu melhor amigo, ou o amor de sua vida.
    Estamos igualmente instando as autoridades a refletirem muito antes de criarem normas impossíveis de serem cumpridas, deixando portas escancaradas ao arbítrio e, por conseguinte, à corrupção. O sujeito que busca agir corretamente e acaba autuado com fulcro em regras risíveis se sente legitimado a jogar a toalha e procurar se dar bem.
    Normas claras, feitas realmente para serem observadas, fiscalização séria e alteridade ajudam a prevenir a corrupção e os males que lhe são inerentes. Se nada disso adiantar, entra o Direito Penal, com pena privativa de liberdade. Condenações recentes podem até fomentar a mudança de comportamento, mas a convicção de que renovar é necessário funciona muito melhor do que o medo. 2014 pode ser diferente.

    João Paulo Cuenca

    folha de são paulo

    Turismo capilar

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    Nos últimos anos, uma rotina de viagens cada vez mais longas fez com que eu passasse a cortar o cabelo sempre fora do Brasil. Abandonei a estável relação que tive com barbeiros de nomes como Péricles e Kléber para aventurar-me na roleta da tesoura desconhecida. Como certa vez escreveu Alan Pauls, "cada salão que não se conhece e no qual se aventura é um perigo e uma esperança, uma promessa e uma armadilha". Destaco aqui alguns relatos desse constante flerte com a desaparição.
    Madri
    No boêmio bairro de Malasaña, fica a Corta Cabeza. Descendo pela Corredera Baja de San Pablo, depois de um lauto almoço e alguns mojitos, vejo a fachada em estilo industrial e decido entrar. Sou sempre atravessado pela decisão de cortar o cabelo na viagem de forma imperiosa, como se vivesse um daqueles raros momentos de iluminação. A certeza que acompanha cada passo. Eles tinham horário, era o meio de uma tarde calorenta de terça-feira.
    Quem lavou a minha cabeça foi uma bela travesti filipina com 1,80 m e mãos firmes. Meditar de olhos fechados enquanto um desconhecido entrelaça os dedos pelos seus cabelos molhados com água quente e xampu é um dos grandes prazeres da vida, inclusive superior à toalha morna que antecipa o toque da lâmina no rosto. Meu barbeiro foi um anão. Quando sentei na poltrona de couro negro, seu rosto ficou exatamente na altura da minha cabeça. Atmosfera almodovariana à parte, foi o melhor repicado que tive em anos. A Corta Cabeza diz em seu site (cortacabeza.com): "Somos fabricantes de beleza". Digamos que, em mim, eles tentaram com bravura.
    Berlim
    O Bernardo Carvalho já escreveu sobre ele, mas creio que o conheci primeiro. Trata-se do barbeiro comunista de Neuköln, cujo negócio tem como símbolo a foice e a tesoura no lugar no martelo. O lugar fica no coração do bairro de imigrantes turcos e árabes, centro do aparentemente inesgotável debate sobre gentrificação que domina a cidade. É um salão com apenas uma cadeira, paredes desbotadas e quadros "naïf" francamente horríveis pendurados na parede. Quando perguntei em inglês se ele tinha horário, me olhou com má vontade e disse: "Volte às seis da tarde. E lave o cabelo!".
    Três horas depois, lá eu estava de novo, sentado com um lençol branco sobre o colo ouvindo um disco de rock industrial. O homem, um tipo de 45 anos, camiseta rasgada e cabelos esvoaçados, se desentendeu com o cortador elétrico e jogou-o no chão. Gritou com a assistente, que, desconfio, também era sua mulher. Chutou um balde de lixo no cachorro que dormia esparramado num canto. O cachorro latiu. Como eu não falo alemão, sorri em desespero. Depois, o homem monologou contra Berlim, a Alemanha, os turistas, os preços dos aluguéis e o aburguesamento do bairro enquanto gentrificava minhas madeixas com um corte à la Playmobil. Conversamos sobre música e arte contemporânea. Escrevendo este texto, descubro em obituário do jornal "Tagesspiegel" que ele morreu em agosto deste ano. Enfartou com a tesoura na mão.
    Buenos Aires
    O Rojo é o salão hipster quase-fora-de-moda da cidade, onde estrelas do rock e "wannabes" em geral cuidam de seus mullets e franjinhas há duas décadas. O Rojo original fica em Caballito, mas para usufruir do espetáculo completo, recomendo a unidade de Palermo Viejo, na Calle Malabia 1.931. Após a lavagem -no teto, telas exibiam um clipe hipnótico e sensual que se repetiu dezenas de vezes-, uma diligente funcionária me levou pela mão até a sala principal. Ali está a magia do lugar. As duas paredes de espelhos, cortadas por faixas de LED em movimento multicolor, refletem-se num jogo infinito. De cada lugar, você é capaz de ver seu rosto e suas costas, assim como o rosto e as costas de todas as outras pessoas, tudo multiplicado até a dissolução. É como entrar dentro de um caleidoscópio.
    Se nas milongas e cafeterias de Buenos Aires os espelhos evocam metafísica, esse aquário de reflexos desperta curiosidades e tremores em partes inferiores do abdômen. Enquanto sentem a suave mordida da tesoura contra seus couros cabeludos, os clientes portenhos se miram. E se miram. E se miram. E se miram.
    j. p. cuenca
    J. P. Cuenca, 35 anos, é escritor. Autor dos livros "Corpo Presente" (2003), "O Dia Mastroianni" (2007) e "O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente" (2010), foi selecionado em 2012 pela revista britânica "Granta" como um dos 20 romancistas brasileiros mais promissores com menos de 40 anos.

    Monica Bergamo

    folha de são paulo

    Governo lança campanha Turismo Acessível

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    O Ministério do Turismo vai pressionar hotéis e atrativos turísticos a se tornarem acessíveis a pessoas com deficiência e dificuldade de locomoção. Uma campanha inclui a criação de aplicativo de celular em que usuários poderão avaliar a acessibilidade de 51 mil estabelecimentos. Os mais elogiados serão premiados –e os campeões de reclamação vão receber um alerta para se adaptar.
    PODE ENTRAR 2
    Com o lema "Um Brasil onde todos podem viajar", a campanha Turismo Acessível terá anúncios para sensibilizar empresários e administradores públicos. A iniciativa é parceria com a Secretaria de Direitos Humanos e o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência -que somam 45 milhões em todo o país.
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    "Estamos muito atrasados em relação à acessibilidade", diz o ministro do Turismo, Gastão Vieira. Ele cita como exemplo a Itália, que aumentou o número de visitantes , segundo ele, após melhorar as condições de circulação.
    CORPO SÃO, MENTE SÃ
    Alê de Souza
    Foto de ensaio com a atriz Carolina Dieckmann para a revista 'VIP'
    Foto de ensaio com a atriz Carolina Dieckmann para a revista 'VIP'
    Carolina Dieckmann, 35, não está nem aí para os dois quilos que toda mulher quer perder. "Faz parte achar que pode estar sempre melhor. Mas isso não me tira a paz. Sou abençoada de ter 35 anos, dois filhos e, depois de ter engordado 30 quilos na minha segunda gestação, voltar a me sentir feliz com meu corpo", diz.
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    A atriz afirmou em entrevista para a revista "VIP" de janeiro que a definição de seu destino como mãe e esposa foi racional e planejada. "Escolhi a vida que tenho, casar, ser mãe cedo. Gosto de ter responsabilidade, de ter horários, comprometimento."
    PAPAI NOEL
    Entre os dez brinquedos mais procurados no site de compras Mercado Livre para este Natal estão o boneco Furby, as pistolas automáticas Nerf, piscinas de bolinhas e os minions. Cerca de 6,7 mil brinquedos foram vendidos, ou 30% a mais do que em 2012.
    PAPAI NOEL 2
    Numa pesquisa que o mesmo site fez com a empresa de mercado Oh!Panel, 50,5% das pessoas responderam que pretendiam quitar as compras de Natal à vista.
    MÚSICA CHICLETE
    O cantor Buchecha batizou de "Adesivo" seu próximo disco, que sai em fevereiro de 2014. "É um álbum bem misturado, com músicas para a noite, pegação, funk melody", antecipa.
    *
    Seu filho Clauci Júlio, de 14 anos, é autor de uma das faixas, onde faz o primeiro dueto com o pai.
    PRÓXIMA ESTAÇÃO
    Uma integrante do conselho estadual dos direitos da população LGBT de SP está acusando um motorista de ônibus da viação Breda de homofobia. Cecília Bezerra diz que, na ocasião em que teria sido alvo de intolerância, usava uma camiseta com os dizeres "respeito gay" e estava com sua companheira. Ela afirma que foi impedida pelo condutor de embarcar no veículo, que ia de Bertioga à Mogi das Cruzes, em São Paulo. "O motorista disse que 'gente assim, da minha espécie', não poderia entrar", conta.
    MESMA COISA
    A conselheira afirma que já contratou advogado para entrar com ação com pedido de indenização por danos morais contra a empresa. "Não é porque eu não sou a [cantora] Daniela Mercury [que se casou recentemente com a jornalista Malu Verçosa] que não posso falar", diz. A Breda informa que está apurando a denúncia.
    FEIJÃO POP
    A empresária Tania Bulhões organizou feijoada em sua loja para o stylist Yan Acioli, que lançou uma linha de camisetas. A modelo Fernanda Motta e a empresária Carol Celico, mulher do jogador Kaká, foram ao evento. O ator Thiago Adorno, o arquiteto Osvaldo Tenório e o apresentador Matheus Mazaferra também passaram por lá.

    Yan Acioli lança linha de camisetas

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    Bruno Poletti/Folhapress
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    O stylist Yan Acioli recebeu a modelo Fernanda Motta e o apresentador Matheus Mazzafera na feijoada de lançamento de sua linha de camisetas, na loja de Tania Bulhões, na sexta (20)
    CURTO-CIRCUITO
    O Bar Charles Edward faz Festa do Branco amanhã, às 21h, no Itaim Bibi. 18 anos.
    O produtor cultural Expedito Araujo comemora aniversário com reunião hoje, em sua casa, nos Jardins.
    O grupo Roupa Nova se apresenta nos dias 24 e 25 de janeiro no Citibank Hall. às 22h. 14 anos.
    com ELIANE TRINDADE, JOELMIR TAVARES, ANA KREPP e MARCELA PAES
    mônica bergamo
    Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

    Vinicius Torres Freire

    folha de são paulo

    O mito das férias até o Carnaval

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    "O BRASIL só volta a funcionar depois do Carnaval", diz a lenda. Fecha por estes dias de "festas", reabre nas Cinzas. O ano que vem, de Copa, eleições e um abril generoso de feriados, seria ainda menor (em 2014, Tiradentes, 21 de abril, vem logo depois da Semana Santa).
    É verdade que vadiaremos até o Carnaval? Não, óbvio que não. O dito popular faz parte do nosso repertório de frases autodepreciativas e, no caso, ressentidas. Para os adeptos do clichê, o país seria uma droga porque somos carnavalescos demais, adeptos da folgança. No entanto, quase todos vamos trabalhar como sempre até o Carnaval e depois; talvez durante também.
    Mas um invejado "alguém", um bode expiatório, vadiaria no início do ano. É verdade, ainda assim, que o país para até o Carnaval? De certo modo, sim, como outros. A Europa Ocidental fica meio morta no verão. Mesmo os americanos dão uma pausa, até no mercado financeiro.
    O "depois do Carnaval" deles é setembro, mês de simbolismos (políticos e sociais), de "volta à real" e de mudanças de humor significativas. Afora o fim das férias, lamenta-se que virão o frio e os dias curtos e escuros. Aqui, temos as férias das crianças. O trânsito de São Paulo fica 1,347% menos infernal. Circula-se menos, consome-se menos.
    O número de horas trabalhadas cai no primeiro bimestre ou trimestre. Há menos gente trabalhando. Descontadas outras influências, no início do ano a quantidade de horas trabalhadas cai de 1,5% a 2%. Parece pouco. Mas, na média, em meses "normais", queda desse tamanho seria sinal de crise feia.
    O que se passa é meio óbvio. Trabalhadores temporários do comércio, alguns serviços e indústria perdem o emprego após o esforço de produção e vendas para os meses melhores, no final do ano. Há folgas coletivas. A construção, em especial nos Estados da estação de chuvas (centro-sul), reduz a marcha.
    O comércio pena com a classe média sazonalmente depauperada: as pessoas gastaram demais no final do ano e serão atropeladas por impostos e conta da escola privada.
    Sim, há recessos no serviço público, no Judiciário e nos Parlamentos, o que chama a atenção, dada a má fama laboral dos políticos. Com o recesso, o governo fica na leseira.
    Como o Brasil depende demais do governo (dinheiro, favores e fofocas), parece ainda mais que o tempo parou. Sim, não há futebol ou esportes em geral; o pessoal de teatro e música dá um tempo.
    Aparecem vinhetas de Carnaval na TV e reportagens de praia. Parece que está todo mundo fazendo fantasia de Carnaval e tostando na areia, menos a gente. Só que não. Sim, muda o "climão". Sim, nós e o resto do mundo passamos por ciclos. Só isso.
    vinicius torres freire
    Vinicius Torres Freire está na Folha desde 1991. Foi secretário de Redação, editor de 'Dinheiro', 'Opinião', 'Ciência', 'Educação' e correspondente em Paris. Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de terça a sexta e aos domingos

    José Simão

    folha de sãO PAULO

    Réveillon! Vou dar rolezinho!

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    Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
    Aí anteontem o Renan Implante Voador apareceu na TV e todos gritaram: "Foi esse cabelo que nós pagamos?". Horrível! Quebra de "decouro cabeludo". Rarará!
    Pronto, peru engolido! Missão cumprida! Agora é rumo a 2014! Feliz 2014! Ou como dizem lá em Brasília: Feliz 2014%! E tão loucos pra chegar em 2050%! Ops, em 20100%! Rarará!
    E olha o modelo que escolhi pro Réveillon: Havaiana faltando uma tira, bermuda caindo aparecendo a cueca e bonezinho QuickSilver. Aquele que os manos usam pra fazer "rolezinho" em shopping!
    E eu tenho uma amiga tão insegura, mas tão insegura, que escreveu na calcinha pro Ano Novo: "Você me ama mesmo ou só quer me comer?". Rarará!
    E o cartão de fim de ano do Mantega: "Feliz Natal OU Próspero Ano Novo!". Os dois não dá! E esta placa: "Aluga-se casa para REVELIÃO". Réveillon de corintiano? Ou então Revelião na Papuda!
    E a clássica pergunta: "Onde você vai passar o Réveillon?". Empurrando o cara na minha frente pulando onda. Você empurra e grita: "Feliz Ano Novo!". Tchibumga!
    E é hoje, viu! Tô com a mesma azia do ano passado, do ano atrasado e do ano retrasado. E parece que eu engoli um zoológico: peru, porco, galinha! E esse maldito peru que não acaba! Cada pedaço que você corta, parece que aumenta. Peru até no café da manhã!
    E as simpatias de fim de ano? Pular sete ondas. Se eu pular sete ondas, eu morro afogado! Guardar sete grãos de romã na carteira. Obrigado, prefiro guardar sete cartões de crédito black infinity platinum plus gold! Rarará!
    Retrospectivas! Retrospectiva do Ciro Botelho: "Você não é rico como o Messi, o PIB desce, a barriga cresce, o pinto amolece e vai parar na fila do INSS!". Rarará!
    "Retrospectiva 2013! Esqueci!". "Retrospectiva 2013! Só engordei!". "Retrospectiva 2013! Melhor Deixar Quieto!". Melhor, mesmo! Rarará!
    E Boas Entradas. E Melhores Saídas! Porque o último que me desejou boas entradas, eu entrei pelo cano.
    Tô na Bahia. Só volto quando botarem a rede pra lavar. Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

    Contardo Calligaris

    folha de são paulo
    Filmes para gente grande
    Cuidado, viver uma vida fútil poderia ser uma decisão moral: o único jeito de não mascarar a futilidade da vida
    Em geral, nesta época do ano, somos invadidos pelos filmes aos quais é possível assistir em família, com as crianças. De fato, para muitos, no dia 25, uma sessão coletiva de cinema é um alívio --uma trégua silenciosa depois do interminável (e, às vezes, penoso) almoço de Natal.
    No entanto, aleluia: nestas últimas semanas chegaram ao menos três filmes que são para gente grande: "Jovem e Bela", de François Ozon, "Azul É a Cor Mais Quente", de Abdellatif Kechiche, e "A Grande Beleza", de Paolo Sorrentino.
    Nenhum deles é para famílias na tarde de Natal; suponho que seja por isso que muitos sentiram a necessidade de se defender contra os três, com unhas e dentes.
    Sobre "Jovem e Bela", já escrevi (http://migre.me/h8kKP). É um filme tocante e verdadeiro sobre uma adolescente que, na fantasia e na prática da prostituição, encontra um caminho para crescer.
    Houve quem conseguisse declarar, sem muita coerência, que 1) ninguém tem fantasia de prostituição (oh, dó!), 2) quem tem essa fantasia não a pratica (oh, dó!), e 3) se alguém a tem e a pratica, certamente não é adolescente de classe média (oh, mais dó!).
    O filme é imperdível --especialmente para quem tiver interesse em entender a grandeza e a coragem da experiência adolescente, com ou sem prostituição.
    Com "Azul É a Cor Mais Quente", que é a história da paixão entre duas jovens mulheres, aconteceu que muitos, comovidos (a contragosto?) pelo filme, afirmaram que ele merece ser visto por ser uma grande história de amor, perda, dor e separação. O fato de que o amor em questão seja entre duas mulheres seria, em suma, sem relevância.
    Ou seja, assista ao filme, mas, para apreciá-lo, esqueça-se de que se trata de duas mulheres. Acreditarei na boa fé desses comentários quando as mesmas pessoas, escrevendo sobre "Romeu e Julieta", acharem oportuno observar: pouco importa que se trate de um jovem moço e de uma menina, poderiam ser dois homens ou duas mulheres, o que importa são os sentimentos.
    Mas quero falar de "A Grande Beleza", que acaba de estrear. A reação de defesa, nesse caso, consistiu em ler o filme como uma crítica moral ao mundo que ele apresenta.
    No passado, Jep Gambardella (o extraordinário Toni Servillo) escreveu um romance que teve um certo sucesso, mas que ele mesmo considera pouco relevante. Ele vive numa Roma rica e mundana, decidida a se convencer de que ela está se divertindo muito.
    Alguns dizem que o filme retrata a decadência da Itália. O que sobrou da grandeza passada são as artes da vaidade --a moda, o design, o estilo: somos os reis do supérfluo. Outros saem do cinema convencidos de que Sorrentino, como eles, tem ojeriza pela vida "vã" do protagonista. Jep trabalha pouco, vira as noites, bebe além do devido: ele é fútil.
    Mas não é bem assim. Marcello, o protagonista de "A Doce Vida", de Fellini, ele, sim, era um desadaptado na futilidade de Roma (e do mundo): esperava reencontrar uma inocência perdida e escrever enfim algo que valesse a pena.
    O espírito de Jep (e de Sorrentino) é outro. Tem mais a ver com a elegância e a coragem da bandinha que continuou tocando enquanto o Titanic afundava. Em Roma isso tem um sentido especial: a festa continuou com os bárbaros às portas; e ela continua agora que os bárbaros já chegaram há tempos. É uma prova de decadência? Ou de sabedoria?
    Aos olhos dos engajados (como Stefania, no filme), Jep talvez pareça desprezivelmente cínico. Mas ele é o último dos românticos, que vive como se a única resposta honesta ao vazio do mundo fosse a fragilidade da beleza: a beleza de Roma ou a de um terno perfeitamente cortado, tanto faz.
    São desculpas pela futilidade? Talvez. Mas, cuidado, uma vida fútil poderia ser a única maneira de não mascarar a futilidade da vida. Qual é o efeito moral certo do "lembre-se da morte"? Ou melhor, qual é o melhor jeito de se lembrar da morte? Uma austeridade sisuda ou, ao contrário, o difícil exercício de não levar a vida a sério?
    Criança, nos anos 1950, assisti a "O Salário do Medo", de Clouzot. Ainda hoje me lembro que o piloto (Mario?) de um dos caminhões de dinamite, fadados a explodir, enquanto se barbeava, dizia que, se ele tiver que morrer, queria ao menos ter uma aparência decente.
    "A Grande Beleza" é um dos nove filmes pré-selecionados para o Oscar de melhor filme estrangeiro. Torço por ele.
    Para os amigos filósofos, uma sugestão (já antiga): "Aesthetics and Ethics: Essays at the Intersection", de J. Levinson (Cambridge).