terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Estado pressiona prefeitura para fechar 'hotéis do crack'

folha de são paulo
Secretaria de Alckmin fez dossiê com mapeamento de 18 locais irregulares
Gestão Haddad diz que fechar locais sem oferecer assistência aos usuários de drogas irá levar mais gente às ruas
ANDRÉ MONTEIRODE SÃO PAULOO governo estadual está pressionando a Prefeitura de São Paulo para fechar hotéis e pensões irregulares na cracolândia sob a justificativa de que eles facilitam o consumo e o tráfico de drogas na região.
A área de inteligência da Secretaria da Segurança Pública chegou a elaborar um dossiê que foi encaminhado em novembro ao prefeito Fernando Haddad (PT).
O documento, ao qual a Folha teve acesso, contém fotos, endereços e a situação legal de 18 locais. Desses, dez não possuem sequer CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) e alvará de funcionamento, irregularidades que poderiam levar a seu fechamento pela prefeitura.
Além dos hotéis e pensões, a lista inclui imóveis invadidos e moradias coletivas que, segundo o documento, podem ser frequentadas por usuários e traficantes.
O dossiê afirma que "para a consecução da atividade criminosa, em muitos casos, indivíduos diretamente envolvidos nos fatos têm feito uso de estabelecimentos comerciais do tipo hotéis ou pensões cujas condições internas e externas facilitam e fomentam práticas ilícitas".
Segundo policiais e agentes de saúde que atuam na cracolândia, esses locais são usados por usuários e traficantes --a venda de drogas, às vezes, recebe o consentimento dos proprietários.
A pressão sobre a prefeitura causou mal-estar entre as equipes das gestões Haddad e Geraldo Alckmin (PSDB).
A prefeitura confirma ter recebido o dossiê, mas diz que já tratou do assunto com o governador e secretários em reunião na semana passada.
Na avaliação da administração, fechar os locais sem oferecer assistência aos usuários irá levar mais pessoas às ruas e piorar a situação da região, que já assiste ao surgimento de uma "favelinha" na alameda Dino Bueno.
A gestão Haddad afirmou ainda que não seria possível tomar medida unilateral sem auxílio da Polícia Militar na própria fiscalização e na repressão ao tráfico de drogas.
Segundo a prefeitura, houve acordo na reunião para o início de uma ação conjunta entre Estado e município.
O trabalho envolve reforço na segurança, limpeza, tratamento de usuários e assistência para os moradores da "favelinha", na tentativa de acabar com a ocupação.
A fiscalização dos hotéis e pensões irregulares seria feita numa segunda etapa.
O hotel Avaré, que aparece na lista, diz que não aceita usuários e nega favorecer o tráfico. Representantes dos outros estabelecimentos não foram localizados.
    Haddad quer empregar viciados em parques de SP
    Prefeitura estuda criar 400 vagas de trabalho para moradores de rua
    Ação tem o objetivo de acabar com 'favela' surgida este ano em rua da cracolândia, no centro de São Paulo
    DE SÃO PAULOA gestão Fernando Haddad (PT) estuda criar vagas de trabalho para empregar usuários de drogas da região da cracolândia em serviços de zeladoria para a prefeitura, como o cuidado de parques e outras áreas públicas.
    O projeto deve ser criado por decreto, mas ainda está em fase de análise da viabilidade jurídica e financeira.
    A ideia é abrir cerca de 400 vagas temporárias.
    O valor e a forma de remuneração ainda estão sendo definidos pela administração. Está em análise se o pagamento será feito em dinheiro ou por meio de um cartão.
    Também estão sendo definidos os critérios de admissão no programa. A gestão pretende criar mecanismos para acompanhamento dos selecionados e formas de encaminhá-los a emprego fixo.
    O público alvo do projeto são todos os moradores de rua da cracolândia, muitos deles usuários de drogas.
    Mas a iniciativa é sobretudo uma tentativa de desmontar uma "favelinha" surgida há alguns meses na alameda Dino Bueno com a rua Helvétia, na calçada do terreno da antiga rodoviária.
    O imóvel foi demolido há alguns anos para dar lugar a um centro cultural do Estado, mas o projeto está atrasado. Há alguns meses, moradores de invasões que foram demolidas, catadores de papelão e até moradores de outras favelas começaram a montar barracos escorados no alambrado do terreno.
    A "frente de trabalho", como o projeto é chamado, é uma tentativa de convencer os moradores a deixar o local. A ação será articulada com oferta de vagas de internação para viciados, auxílio aluguel e reforço na limpeza, para evitar a construção de novos barracos.
    A expectativa da prefeitura é concluir o projeto até o fim do ano, mas não foi fixado um prazo para o início do recrutamento e da seleção dos interessados.
    A iniciativa ocorre no momento em que o governo estadual reforça as ações de saúde na cracolândia.
    Desde a semana passada, um micro-ônibus do Programa Recomeço está estacionado na rua Helvétia. Agentes estão recolhendo e levando para tratamento em clínicas cerca de dez usuários de drogas por dia, em média.
    Também está previsto que mais 70 agentes de saúde do governo estadual comecem a atuar por lá nesta semana.
    A área da saúde será um dos principais temas da campanha eleitoral de 2014, que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) deve disputar com o ministro Alexandre Padilha (Saúde), do PT de Haddad.
    Com as ações, a intenção dos dois partidos é evitar as críticas de que não atuam para tentar resolver a epidemia do crack.
      'Situação é constrangedora', diz secretário
      ARETHA YARAKDE SÃO PAULO"É uma situação constrangedora. A cracolândia é uma sociedade autônoma e multifuncional."
      A frase de José de Filippi Júnior, secretário municipal de Saúde, resume o mal-estar que a "favelinha" nascida no coração da cracolândia causa à administração municipal.
      Desde julho, depois que o governo do Estado demoliu prédios do entorno que eram usados como moradia, os usuários de crack voltaram a erguer barracos pelas ruas da região.
      Hoje, estima-se que cerca de 500 pessoas vivam em barracos e outras 300 circulem diariamente pelo local. Os números são similares àqueles de antes da operação policial do Estado em 2012.
      "A primeira reação é entrar e recolher tudo. Mas eu estaria apenas criando um problema para a cidade e não resolveria o tráfico", diz Roberto Porto, secretário de Segurança.
      Segundo ele, há um cuidado de não espalhar novamente o crack pela cidade. "Nossa ação é melhor se é centralizada num ponto. Mas o lado negativo é a cidade conviver com aquela situação."
      A política adotada pela prefeitura segue o programa "Crack, é possível vencer", do governo federal.
      Em vez de uma ação mais inibitória, essa política preza pela redução de danos --e teria, portanto, resultados mais lentos e "transparentes".
      A ideia é que, uma vez que os usuários se sintam à vontade com a presença da prefeitura, eles acabem procurando tratamento.
      "O poder público tem que estar pronto para receber essa pessoa quando ela pedir ajuda", diz Luciana Temer, secretária de Desenvolvimento Social.
      Segundo ela, o trabalho de reconquista do usuário já pode ser visto no De Braços Abertos. O centro funciona como um espaço de ação em saúde e atendimento social.
      "Antes, eles se afastavam do poder público porque tinham medo da internação compulsória. Conseguimos reconquistar a confiança. Hoje, temos 400 usuários fiéis ao centro", diz Luciana.

        Mirian Goldenberg

        folha de são paulo
        Homem não chora
        Os homens parecem ser mais livres que as mulheres para rir, mas ainda não são livres para chorar
        Perguntei a homens e mulheres das classes médias cariocas: "Você chora muito, pouco ou nunca?": 52% das mulheres responderam que choram muito, 46% que choram pouco e 2% disseram que nunca choram.
        Já os homens responderam que choram pouco (58%) ou nunca (37%). Apenas 5% disseram que choram muito.
        Quando perguntei: "Quem chora mais: o homem ou a mulher?", 95% dos pesquisados disseram que a mulher chora mais, e os demais afirmaram que não existe diferença de gênero no choro.
        Nenhum pesquisado disse que o homem chora mais do que a mulher.
        Noventa e sete por cento dos pesquisados discordaram da frase "homem não chora", dizendo que é machista, preconceituosa, clichê, estereotipada, ultrapassada, mentirosa, mito, tabu.
        Eles e elas apontaram as seguintes razões para a mulher chorar mais: tensão pré-menstrual, hormônios, sensibilidade, emotividade, fatores culturais e, especialmente, liberdade para chorar.
        As mulheres seriam mais livres para expressar emoções como tristeza, dor, sofrimento, fragilidade, insegurança, medo.
        Uma jornalista de 40 anos disse: "Eu acho que os homens sofrem menos e por isso não choram. Quando me separei, passei meses chorando. Meu ex-marido enchia a cara de cerveja todos os dias e parecia estar se divertindo muito".
        Uma professora de 57 anos contou: "Em 25 anos de casados, nunca vi meu marido chorar, nem quando o pai dele morreu. Ele diz que chora para dentro, que engole o choro. Ele cresceu ouvindo frases como: homem não chora', quem chora é mulherzinha ou veado'. Ele tem vergonha de chorar até comigo e com nossos filhos".
        Um analista de sistemas de 47 anos afirmou: "Eu choro, sim, mas escondido. Quando bebo, choro no banheiro, em segredo. É uma verdadeira válvula de escape, um alívio, uma faxina interna. Lava a minha alma, fico mais leve. Não choro nem na frente da minha mulher ou do meu melhor amigo. Não quero que me achem um fraco".
        Os homens parecem ser muito mais livres do que as mulheres para rir e para brincar. No entanto, apesar de discordaram da frase "homem não chora", eles ainda não são livres para chorar.

        Rosely Sayão

        folha de são paulo
        'Mãe, Papai Noel existe?'
        A figura traz em si uma ideia: a de que alguém quer fazer a alegria de outro alguém nesse dia
        O Natal está aí e muitos pais enfrentam seus filhos, que lhes fazem perguntas ou comentários incômodos: "Papai Noel existe de verdade ou é de mentirinha?" "O Mateus ainda acredita no Papai Noel, coitado. Ele não existe, não é, mãe?" "O Papai Noel é o papai, não é, mãe?".
        Alguns pais não têm dúvida alguma quanto à resposta a dar a seus filhos. Dizem que ele não existe, e ponto final. Alguns até avançam fazendo comentários sobre o consumo exagerado nessa época etc. Mas o problema é que os filhos persistem nos comentários e, mesmo obtendo as mesmas respostas dos pais, voltam ao assunto com frequência.
        Esse fato preocupou muito uma jovem mãe, cuja filha está prestes a fazer sete anos, porque a garota está com dúvidas e quer que sua mãe lhe garanta a existência da figura.
        Mesmo com a palavra dada da mãe de que agora que ela cresceu já sabe que o Papai Noel não existe, depois de um tempo a menina refaz a pergunta de outros modos. "O que ela quer que eu responda?", me perguntou essa mãe.
        Outra mãe chegou a brigar com o filho de cinco anos porque o garoto insiste na crença da figura natalina, o que a mãe não quer. "Gosto mais de falar a verdade de tudo para ele", comentou ela.
        Para começo de conversa, a existência dessa figura não tem relação com a verdade, ou melhor, com a realidade. O Papai Noel é uma figura, para a criança, igual às que vivem nos contos que elas ouvem, como animais que falam, bruxas e fadas, princesas encantadas, duendes etc.
        Todas são figuras míticas que habitam o imaginário da criança e que estimulam sua criatividade, intensificam emoções prazerosas e/ou dolorosas e colaboram para que muitas angústias sejam elaboradas.
        Você já tentou, caro leitor, convencer uma criança de que não há monstro algum em seu quarto, à noite? Ninguém consegue se o caminho tomado pelo adulto for o da realidade. Entretanto, se a solução contemplar a fantasia e a mágica do universo infantil, fica mais fácil.
        Eu sempre me lembro com muita admiração da solução que o pai de um garoto de quatro anos encontrou para acabar com o monstro que impedia o sono da família todas as noites. Depois de tentar provar ao filho que o tal monstro não existia, ele decidiu entrar na fantasia do filho. Comprou uma espada de plástico e disse ao filho que ela era mágica, feita para espantar monstros.
        Deixou a espada ao lado da cama do filho e orientou o garoto a usar a espada caso o monstro aparecesse. Mágica: depois disso, a família voltou a dormir sossegada.
        Com o Papai Noel é a mesma coisa. Creio que as crianças não querem uma resposta para o fenômeno, no qual elas acreditarão independentemente da postura da família. Quando elas perguntam, talvez tudo o que elas peçam seja a possibilidade de uma conversa com seus pais a respeito de seu crescimento, de suas fantasias ou até mesmo da despedida delas.
        Elas querem saber, por exemplo, como substituir a figura do Papai Noel. E é importante que elas saibam que podem fazer isso, pois a figura traz em si uma ideia: a de que alguém quer fazer a alegria de outro alguém nesse dia.
        Mas, para que isso ocorra, os pais precisam se interessar verdadeiramente pelo que seus filhos têm a dizer, escutar com interesse suas ideias sem moralizar, considerar suas hipóteses e, principalmente, achar que o que eles dizem é importante.

        Serra anuncia que não é candidato à Presidência

        folha de são paulo
        Ele disse que o PSDB deve formalizar nome de Aécio Neves 'sem demora'
        Há semanas, dirigentes da sigla, como FHC, pedem a antecipação do anúncio da candidatura do senador mineiro
        DE SÃO PAULOIsolado dentro de seu próprio partido, o ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB) anunciou ontem seu afastamento da corrida presidencial de 2014.
        Em texto postado no Facebook, o tucano disse que os dirigentes do PSDB devem formalizar "sem demora" o nome do senador Aécio Neves (MG), presidente da sigla, como candidato ao Planalto.
        "Como a maioria dos dirigentes do partido acha conveniente formalizar o quanto antes o nome de Aécio Neves para concorrer à Presidência da República, devem fazê-lo sem demora. Agradeço a todos aqueles que têm manifestado o desejo, pessoalmente ou por intermédio de pesquisas, de que eu concorra novamente", escreveu Serra.
        Foi a segunda vez que o ex-governador divulgou uma decisão via rede social. No início de outubro, ele usou seus perfis no Facebook e no Twitter para dizer que permaneceria no PSDB.
        Segundo interlocutores, Serra percebeu que havia muita pressão entre os dirigentes do partido, principalmente do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, para a antecipação da candidatura de Aécio.
        Ele resolveu anunciar publicamente a desistência após conversar com os amigos mais próximos.
        "Foi um reconhecimento de que a posição majoritária do PSDB é de apoio a Aécio", disse o ex-governador de São Paulo Alberto Goldman.
        Ainda de acordo com aliados de Serra, Aécio não foi avisado previamente sobre o gesto. "É uma decisão generosa, de unidade partidária e que foi unilateral", diz o deputado Jutahy Junior (PSDB-BA), um dos principais aliados do ex-governador.
        ACORDO
        Serra e Aécio firmaram acordo para que a oficialização da candidatura tucana só fosse feita em março. Até lá, ambos poderiam seguir com agendas próprias de pré-candidato.
        Nas últimas semanas, porém, diversos dirigentes do PSDB passaram a defender uma antecipação do anúncio da candidatura do mineiro.
        No início de novembro, Fernando Henrique se reuniu com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e com o próprio Aécio no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo estadual paulista, para reavaliar o cronograma eleitoral do partido.
        À época, os tucanos acreditavam que as intensas movimentações de Serra, que viajava para recolocar seu nome à disposição para a disputa de 2014, estava incomodando a bancada do PSDB na Câmara dos Deputados.
        O líder do partido na Casa, deputado Carlos Sampaio (SP), disse à época que a indefinição da candidatura "tirava a capacidade de articulação política de Aécio".
        FUTURO
        Serra avalia ainda se vale a pena sair candidato ao Senado ou à Câmara dos Deputados no ano que vem.
        "É um excelente candidato para qualquer outra posição. Cabe a ele decidir", disse o presidente do PSDB-SP, deputado Duarte Nogueria.
        Nas pesquisas para a Presidência, Serra apresenta um desempenho ligeiramente melhor que o de Aécio. Sua taxa de rejeição, porém, também é maior.
          Esboço do programa de Aécio acena para agronegócio
          DE SÃO PAULOO senador Aécio Neves (PSDB-MG) usará o primeiro esboço de sua plataforma de governo, que será apresentado hoje em Brasília, para fazer um aceno ao segmento do agronegócio.
          Composto por 12 itens, o documento está dividido em três eixos básicos: confiança, cidadania e prosperidade.
          Tradicionalmente aliado dos tucanos, o agronegócio é tema no eixo "prosperidade", em que o senador tucano defende "gestão técnica" e "livre do aparelhamento político" para o setor.
          Provável candidato do PSDB à Presidência em 2014, Aécio diz que a atividade deve ser tratada com mais atenção pelo Estado, com políticas e pesquisas públicas coordenadas pelo Ministério da Agricultura.
          Segundo interlocutores, o aceno mais enfático ao agronegócio deve-se ao assédio frente ao setor do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que deve ser um dos principais adversários de Aécio nas eleições do próximo ano.
          Outro aceno é aos participantes dos protestos de junho. O direito a serviços de qualidade na educação, na saúde, no transporte e na segurança é tema do eixo "cidadania", com reivindicações pela melhoria do SUS (Sistema Único de Saúde).
          Fala também na criação de uma Lei de Responsabilidade Educacional, com metas de gastos e pagamento de bônus a professores e diretores de escola de acordo com desempenho.
          Para a segurança, a proposta é criar uma política nacional de segurança pública que, segundo o mineiro, não existe hoje no Brasil.
          FEDERALISMO
          O pacto federativo para fortalecer Estados e municípios, uma das principais bandeiras de Aécio, é um dos destaques do texto.
          Para o tucano, a União concentra a maior parte das riquezas do país enquanto sobra para Estados e municípios a responsabilidade de resolver problemas.
          A inclusão desse ponto foi acertada em conversas entre Aécio e Eduardo Campos (PSB). Em documento lançado em novembro pelo socialista e sua colega de chapa, a ex-senadora Marina Silva, o rearranjo federativo foi citado genericamente.
          O documento do PSDB estará disponível na internet, no site "Conversa com brasileiros", para consulta pública antes de ser submetido à Executiva Nacional do partido, o que deve ocorrer no início do ano que vem.

            A inclusão de pessoas com deficiência - Alexandre Schmidt de Amorim

            folha de são paulo
            ALEXANDRE SCHMIDT DE AMORIM
            TENDÊNCIAS/DEBATES
            A inclusão de pessoas com deficiência
            Muitos alunos que saem de escolas especiais têm como maior impeditivo no ensino regular não a estrutura física, mas o preconceito
            O debate sobre a inclusão de pessoas com deficiência no ensino regular e a eliminação, ou não, das escolas especiais exige cautela, e não radicalismos. É justamente desse tema que trata a meta 4 do Plano Nacional de Educação.
            A educação especial impacta 820.400 estudantes no Brasil (Censo Escolar, 2012). Hoje, 25% (199.656) deles estão nas instituições especiais. O número é grande e, por isso, antes de qualquer decisão política, é preciso saber quem são esses alunos, o que eles precisam e onde eles podem ser melhor atendidos.
            Os pontos de análise são o preparo do ensino regular para receber alunos com deficiência, o papel das escolas especiais e a sociabilização.
            De forma prática, a inclusão não é possível e positiva para todos. Existem diferentes tipos de deficiências --algumas em que a idade mental não passa de um ano e outras em que a possibilidade de aprendizagem é maior. É preciso estar pronto para lidar com cada uma delas, em seus diferentes níveis.
            Em primeiro lugar, o ensino regular precisa ser melhor preparado para receber os alunos com deficiência que tenham potencial de inclusão. Os esforços públicos devem ir além do investimento em estrutura física. Precisam capacitar o professor, disponibilizar em número suficiente profissionais de apoio e orientar os demais alunos. Acompanhamos muitos casos, em todo o país, de alunos que saem de escolas especiais e têm como maior impeditivo no ensino regular não a estrutura física, mas o preconceito.
            Em segundo lugar, precisamos entender que as mais de 4.000 escolas especiais no país desempenham papel fundamental para o deficiente que não acompanha o currículo regular. Essas instituições trabalham dentro dos potenciais do indivíduo e com o acompanhamento de que ele necessita.
            Sabemos que, na prática, o professor do ensino regular não pode diminuir o ritmo de aula em função de um aluno. Por isso o fortalecimento das escolas especiais é fator de sucesso para o desenvolvimento pleno da pessoa com deficiência. No caso dessas escolas, o investimento deve ser aplicado na infraestrutura, aí sim o maior limitador de crescimento e causador da longa fila de espera.
            O terceiro ponto, a socialização, deve se dar no ensino regular e no especial. É um fator decisivo no processo de inclusão. As práticas que promovem o relacionamento dos alunos de escolas especiais com os das regulares devem ser valorizadas e replicadas, uma vez que diminuem o preconceito e ajudam no desenvolvimento de todos.
            Do mesmo modo, a sociedade deve ser foco de campanhas que levem à compreensão da deficiência, dando oportunidades de atuação para o deficiente, como o mercado de trabalho, esporte e atividades culturais.
            Ao poder público, cabe apoiar a orientação das famílias que têm filho com deficiência, garantindo informação e formação para os parentes, tantas vezes esquecidos.
            Com o trabalho nas três frentes, de forma integrada com o poder público, a pessoa com deficiência se desenvolverá dentro das suas potencialidades e será integrada como alguém capaz de exercer uma função útil em busca de seus objetivos.

            Editorial FolhaSP

            folha de são paulo
            USP do B
            Acumulam-se, na USP Leste, insólitos problemas incompatíveis com qualquer instituição de ensino --ainda mais com a principal universidade da América Latina.
            No episódio mais recente --e mais bizarro--, a direção da USP Leste anunciou a decisão de antecipar as férias por causa de uma infestação de piolhos de pombos. Na semana passada, três salas de aula haviam sido interditadas; inúmeros alunos e professores manifestaram sinais de escabiose (sarna).
            Não bastasse, a Sabesp (Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo) recentemente analisou a água do campus e encontrou turbidez e presença indevida de bactérias. Os bebedouros não podem mais ser utilizados.
            Isso numa universidade que, em setembro, viu seus professores entrarem em greve depois de a Cetesb (agência ambiental paulista) verificar no local uma perigosa concentração de gás metano, altamente inflamável. A área chegou a ser interditada, e uma multa de R$ 96,8 mil foi aplicada.
            Em nota, a própria USP informou que seu campus na zona leste (em Ermelino Matarazzo, às margens da rodovia Ayrton Senna) foi construído em área "ambientalmente problemática" em que haviam sido adicionadas terras contaminadas de origem desconhecida.
            Inaugurada com pompa em 2005 pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), a USP Leste busca oferecer oportunidades aos jovens de municípios como Itaquaquecetuba, Ferraz de Vasconcelos, Mairiporã, Suzano, Salesópolis e Guarulhos.
            Alckmin enfatizou que um dos objetivos da iniciativa era a inclusão social, mas deixou claro que seria mantido o padrão USP de qualidade acadêmica. Mesmo localizada em região carente da cidade, a USP Leste não faria o papel de instituição de segunda linha da melhor universidade do país.
            O descalabro atual, contudo, deixa claro que, do ponto de vista prático, a USP Leste foi tratada como uma espécie de prima pobre da matriz do Butantã. Sua criação na área em que se encontra revela-se, aos poucos, medida açodada --decerto com fins eleitoreiros.
            São evidentes os prejuízos para as mais de 4.000 pessoas --entre professores, alunos e funcionários-- que circulam diariamente pela USP Leste. Estão em risco sua saúde e a reputação dos cursos que frequentam.
            Nesta semana haverá eleições para reitor da USP. É mais do que hora de enfrentar as agruras do campus da zona leste de forma estrutural. Isso inclui prestar contas, apurar responsabilidades e agir com transparência.

            Letícia Sander

            folha de são paulo
            E agora, Cabral?
            RIO DE JANEIRO - É de estranhar o silêncio de Sérgio Cabral (PMDB) diante das declarações dadas pelo secretário José Mariano Beltrame por ocasião do aniversário de cinco anos de implantação do programa das UPPs, as Unidades de Polícia Pacificadoras, principal projeto na área de segurança pública no Rio.
            Ao jornal "O Globo", Beltrame comparou o maior legado do governo Cabral a um anestésico e reconheceu que as favelas pacificadas seguem à espera de uma "cirurgia maior". Disse ainda estar mal resolvida a questão sobre o que o Rio quer fazer das UPPs no longo prazo e deixou claro que mudanças estruturais nas favelas exigirão remoções, um assunto tabu que "precisa entrar em pauta e ninguém tem coragem".
            Beltrame em nenhum momento desmereceu a importância do próprio trabalho e o êxito do fim do controle armado nas favelas pacificadas. Mas não se furtou a olhar para a frente e botar o dedo na ferida. "As pessoas gostaram do efeito da anestesia, só que não têm coragem de encarar a cirurgia. A favela tem pressa, e estão deixando a responsabilidade só com as polícias", disse o secretário.
            O projeto das UPPs deu a Cabral mais quatro anos de mandato em 2010 e tudo caminhava para que o tema de novo sustentasse o debate sobre o sucesso da sua gestão na eleição de 2014. Mas os ventos mudaram. Reeleito com a maior votação ao cargo na história do Estado, ele foi "murchando" ao longo do mandato. Fragilizado por uma série de denúncias que cristalizaram a imagem de um gestor "boa-vida", Cabral teve em dezembro o índice mais baixo de aprovação de sua gestão e há uns bons meses anda um tanto calado.
            As UPPs certamente estarão no centro do debate em 2014, mas fica cada vez mais claro que a discussão, agora, requer outro tom. Menos laudatório, mais realista e profundo. E ainda é um mistério como o governador pretende conduzi-la.

              Vladimir Safatle

              folha de são paulo
              Uruguai na frente
              O presidente do Uruguai, José Mujica, entrará para a história latino-americana como alguém que colocou de vez a pauta da modernização de costumes no centro da política. Em seu governo, o Uruguai aprovou a legalização do aborto, o casamento homossexual e, agora, uma ousada legislação de regulamentação da produção e do comércio de maconha.
              O Uruguai partiu de uma constatação cada vez mais assumida nos debates internacionais sobre o problema: "A guerra contra as drogas fracassou". A abordagem policialesca hegemônica é cara e ineficaz, além de infantilizar o debate ao considerar todo consumidor de droga um viciado, ainda que potencial.
              Por mais que isso possa parecer estranho a alguns, não há princípio moral que justifique a proibição do uso de drogas por adultos responsáveis por seus atos. As modalidades de prazer do corpo, bem como a decisão sobre os alimentos e substâncias que consumo, são fruto de deliberações individuais. Cabe ao Estado simplesmente alertar seus cidadãos sobre os riscos de suas decisões.
              Dois argumentos poderiam ser contrapostos a essa maneira de pensar o problema do uso das drogas. Primeiro, usuários de drogas estariam, necessariamente em situação de perda de autonomia. O argumento é ruim por não distinguir usuários esporádicos daqueles que têm estrutura patológica de drogadição.
              Segundo, haveria uma equação indissociável entre droga e violência. Assim, combater a primeira seria, necessariamente, diminuir a segunda. No entanto, há duas violências pressupostas aqui. A primeira é resultado exatamente do tráfico e da ilegalidade do comércio de drogas. Nesse sentido, a lei uruguaia é astuta ao criar um mecanismo estatal capaz de retirar a produção da maconha das mãos de grupos criminosos.
              Por outro lado, haveria a violência resultante da pretensa modificação de comportamento de quem consome drogas. O problema é que, no caso da maconha, o argumento é risível, assim como é risível o argumento de que ela seria necessariamente uma porta de entrada para o consumo de drogas mais pesadas.
              Note-se ainda que nunca houve e, provavelmente, nunca haverá sociedade sem drogas. Assim, melhor do que ficar à procura de um paraíso onde elas não existiriam, procura que no mais das vezes só consegue produzir infernos, é saber como viver com elas. É bem provável que muito de seu consumo seria diminuído se nossas sociedades re- tirassem a aura transgressiva das drogas.
              Ao abandonar a lógica da guerra, os governos poderiam enfim pautar suas políticas pela lógica médica da discussão sobre o uso e seus riscos, como já é feito com bebidas e cigarros.

                José Simão

                folha de são paulo
                São Paulo! Propinetone de Natal!
                'Bolívia lança panetone fabricado com farinha de folha de coca.' Ueba! É o Pónetone! Ou Panecoca
                Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! A Ditadura do Panetone! Ninguém aguenta mais panetone. Nem porteiro de prédio aguenta mais panetone! Panetone dá azia! Rarará! E São Paulo acaba de lançar o PROPINETONE! Panetone fabricado com farinha de propina! São Paulo não é mais terra da garoa, é terra da propina!
                E eu já disse que o homem mais rico do Brasil é o Pina. Tudo vai pro Pina! E esta: "Bolívia lança panetone fabricado com farinha de folha de coca". Ueba! É o Pónetone! O panetone do helicóptero, o pónetone! Ou Panecoca. Você come um pedaço e dança em cima da mesa e vomita na sogra! Rarará!
                E um amigo está em Nova York e disse que só tem brasileiro comprando e tirando foto com o Papai Noel. Que também é brasileiro. Outro brasileiro! Nova York: consumidores brasileiros tiram foto com o Papai Noel brasileiro! É a crise! Rarará!
                E eu já comprei o meu presente de Natal para o Fluminense: "Vire a Mesa", da Estrela! E ganhe grátis um tapete gigante! E o cartaz na padaria: "O pão pode ser francês, mas a padaria será sempre Portuguesa". Rarará!
                E atenção! O site Kibeloco acaba de revelar as manchetes para 2030. Como será o Brasil em 2030? Política: "Bancada Presidiária é maioria no Congresso". Bancada da Papuda! Cotidiano: "Aviões farão rodízio a partir de segunda-feira". E aí o Haddad cria faixa exclusiva para aviões. Rarará.
                Esportes: "Eurico Miranda compra Vasco e Fluminense e faz o VASFLU". Eurico Miranda é aquela almôndega suada! "Brasil vende Acre, Rondônia e parte do Amapá para pagar dívidas da Copa 2014". Eu acho que vai vender Santa Catarina, Goiás e parte da Argentina!
                Entretenimento: "Recuperador de virgindade é sucesso entre ex-BBBs". Objeto mais inútil e machista! "Polêmica: nova Globeleza é sueca". Efeito Fernanda Lima na Fifa! Rarará!
                É mole? É mole, mas sobe!
                Os Predestinados! Secretária de saúde de Vargem Grande, Maranhão: Shirlânia das Dores. Deve ser a parteira do Sarney! E adorei este nome: Shirlânia! "Ai, doutora, tô com uma dor na shirlânia". Rarará.
                E direto de Viamão, Rio Grande do Sul, o dono da funerária se chama Teco Terra. Liga pra funerária que o Teco enTerra! Rarará.
                Nóis sofre, mas nóis goza!
                Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

                  João Pereira Coutinho

                  folha de são paulo
                  Cresce e desaparece
                  A queda do apartheid não começou com a saída de Mandela da prisão, mas com a queda do Muro
                  1. Com a morte de Mandela, confesso que passei horas e horas a ler sobre o senhor. Mas nenhum texto me impressionou tanto --na sua imbecilidade e ignorância-- como o elogio cético que Slavoj Zizek dedicou a Madiba no "Guardian".
                  Verdade que Zizek nunca desilude. Mas o texto atinge novos patamares de mendacidade intelectual quando informa o auditório de que Mandela morreu um homem amargo.
                  Uma afirmação dessas, vinda de um enfermeiro, teria o seu valor. Mas o objetivo de Zizek é político, não clínico: Mandela morreu amargo porque a promessa de uma África do Sul resplandecente não se cumpriu.
                  Até aqui, nada a dizer: a pobreza, a violência e o crime continuam a fazer parte do cotidiano do país. Mas para Zizek essas falhas devem-se à "traição" que Mandela cometeu sobre os seus ideais "socialistas", sucumbindo às sereias do capitalismo.
                  Nesse sentido, Mandela representa bem o destino da esquerda contemporânea, diz Zizek: na oposição a um regime iníquo, a esquerda promete maravilhas sem fim; quando chega ao poder, abre a porta ao compromisso "burguês".
                  A ignorância de Zizek começa logo aqui: ao não entender que o derrube do apartheid começou por um ato de compromisso. Que o mesmo é dizer: Mandela pousaria as armas e o regime começaria a tratá-lo com outra brandura.
                  Isso pode soar ofensivo para quem vive no jardim infantil da política e divide o mundo entre índios e cowboys. Não soou ofensivo para Mandela nem para a ala mais moderada do ANC.
                  Mas há mais: acusar Mandela de atraiçoar os seus ideais "socialistas" é ignorar a importância que o fim desses ideais teve para derrubar o próprio regime.
                  A queda do apartheid, ao contrário do que imagina Zizek, não começou com a saída de Mandela da prisão em 1990. Começou um ano antes, quando um certo Muro de Berlim foi reduzido a escombros. Com o desaparecimento da ameaça ideológica de Moscou, a elite branca não apenas deixou de temer a transição para um regime democrático pleno --como, no limite, o permitiu.
                  Finalmente, Zizek pergunta: não será possível ir além do legado tímido de Mandela sem cair no extremismo totalitário de Robert Mugabe, o vizinho do Zimbábue que arruinou o seu país?
                  Curiosamente, Zizek nem se apercebe da contradição da pergunta: Mugabe destruiu o país porque seguiu a cartilha "socialista" que Zizek acusa Mandela de ter renegado.
                  O resultado desse programa de "coletivização dos meios de produção" determinou que um dos mais prósperos países africanos seja hoje um caso internacional de fome, miséria e, claro, guerra civil larvar de negros contra brancos. Ou, pelo menos, contra os brancos que ainda restam por lá.
                  Quando será que Zizek cresce e desaparece?
                  2. A culpa é de John Lennon: quando o ex-Beatle começou a dissertar sobre os grandes temas do mundo, o mundo prestou atenção e a moda estava lançada.
                  Bizarro: eu gosto da minha empregada doméstica. Mas não presto atenção ao que ela diz sobre, por exemplo, o aquecimento global ou a crise das dívidas soberanas na Europa. Por que motivo devemos prestar atenção ao que dizem os músicos sobre assuntos que eles grotescamente desconhecem?
                  Roger Waters é um caso recente: o líder do Pink Floyd considerou Israel um Estado perfeitamente comparável à Alemanha nazista. Motivo? A forma como trata os palestinos de Gaza e da Cisjordânia. Roger Waters só não explicou direito se também falava dos campos de extermínio e dos fornos crematórios que existem em Tel Aviv.
                  Ponto prévio: você, leitor, pode não concordar com a política de Israel; pode condenar vivamente a construção de assentamentos na Cisjordânia; e pode até atribuir todas as culpas do mundo aos judeus pelo fracasso das sucessivas negociações entre Israel e a autoridade palestina. Está no seu direito e na posse razoável das suas faculdades mentais.
                  Mas quando alguém compara Israel com a Alemanha de Hitler --o mais infame regime da história, que fabricou a morte sistemática de milhões de judeus e outras minorias e foi responsável pela maior catástrofe militar do século 20 --essa comparação não é apenas ofensiva para a "memória das vítimas", como dizem os poetas.
                  A comparação é ofensiva para você, leitor, tratado como um idiota ignorante por outro idiota ignorante.