terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Mirian Goldenberg

folha de são paulo
Você tem borogodó?
Ele disse: 'Mulher ansiosa demais, desesperada para agarrar um homem, não tem borogodó'
Entrevistei uma jornalista de 45 anos para o meu livro "Por que Homens e Mulheres Traem?".
Ela disse ser alvo da inveja de suas amigas por ser uma "mulher livre, não ter filhos e poder transar com quem quer e quando quer".
Suas amigas casadas reclamam que o casamento é uma rotina, que gostariam de ter tido outras experiências, que a vida sexual é ruim, que não existe mais romance e que os filhos atrapalham.
Elas se sentem aposentadas compulsoriamente de uma vida amorosa e sexual satisfatória.
As amigas solteiras sofrem com a falta de segurança e de continuidade das relações amorosas. Reclamam que falta homem no mercado.
A jornalista disse: "Para as minhas amigas, sou quase um mito, já que acham que estou sempre namorando, transo todos os dias e nunca reclamo dos meus homens. Na verdade, fico com homens com quem elas jamais pensariam em ficar. Não ligo se eles nunca ouviram falar de Simone de Beauvoir ou se ganham muito menos do que eu. O que me interessa é que eles sejam carinhosos, me respeitem e me tratem como alguém especial".
Ela contou o caso de uma amiga bem mais jovem e bonita: "Uma madrugada ela ligou para reclamar que eu tinha ficado com um cara que ela estava paquerando. O cara, na minha cama, tentou explicar por que tinha ficado comigo".
Ele disse: "Você tem borogodó, ela não tem. Mulher que quer se fazer de menininha não tem borogodó. Mulher ansiosa e carente demais, desesperada para agarrar um homem, não tem borogodó. Mulher preocupada com rugas, estrias e celulites não tem borogodó. Borogodó tem a ver com segurança, com se sentir bem na própria pele. Algumas mulheres são lindas, mas não têm borogodó. Outras, mais velhas e nem tão bonitas, são charmosas, interessantes, maduras e atraentes".
Ele concluiu: "Até pensei em ficar com sua amiga, mas ela estava se esforçando tanto para me agradar que logo desisti. Quando você chegou ela sumiu do mapa. Fiquei encantado com seu sorriso, sua espontaneidade, sua segurança. Você tem borogodó, ela não. O próprio fato de ligar de madrugada prova a minha teoria. Mulher chata não tem borogodó".
E você? Tem ou não tem borogodó?

    Viciados em sexo - Mariana Versolato e Guilherme Genestreti

    folha de são paulo

    Culpa, autodepreciação e exposição a riscos marcam os relatos dos compulsivos por sexo


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    MARIANA VERSOLATO
    EDITORA-ASSISTENTE DE "CIÊNCIA+SAÚDE"
    GUILHERME GENESTRETI
    DE SÃO PAULO

    "Um ser humano terrível" é como Joe, a protagonista de "Ninfomaníaca - Volume 1", filme do diretor Lars Von Trier que estreou no último fim de semana, se apresenta a um homem que a encontra ferida e sangrando em um beco. Diz ter magoado pessoas e agido de modo trivial e insensível para obter satisfação.
    O relato de Joe, marcado pela autodepreciação, parece corresponder à realidade de quem tem compulsão sexual (leia depoimentos abaixo)

    "O sexo, que era para ser prazeroso, vira obsessão e traz uma série de prejuízos", diz Marco de Tubino Scanavino, médico do Instituto de Psiquiatria do HC da USP.
    "As pessoas procuram tratamento dizendo que estão erradas, arrependidas e julgando-se negativamente."
    Atitudes de risco também são comuns entre os que têm o transtorno. O filme conta pouco sobre o motivo da agressão a Joe, mas ela diz ser a culpada pela situação –e daí entende-se que a compulsão a levou àquele estado.
    Christian Geisnaes/Divulgação
    A atriz Charlotte Gainsbourg, em cena do filme "Ninfomaníaca"
    A atriz Charlotte Gainsbourg, em cena do filme "Ninfomaníaca"
    "O compulsivo age dessa forma mesmo correndo o risco de contrair doenças sexualmente transmissíveis. Há quem se exponha a garotos e garotas de programa que roubam e agridem e a parceiros anônimos que podem trazer problemas", diz Scanavino.
    Apesar de a Organização Mundial da Saúde usar os termos ninfomania (para mulheres) e satiríase (homens) para descrever um apetite sexual excessivo, especialistas dizem que não há distinção entre os sexos na hora de definir o transtorno.
    Os homens, aliás, correspondem a 80% das pessoas com o problema. Segundo estudos, a prevalência é maior entre homens gays e bissexuais, principalmente pela facilidade de acesso a locais como saunas, onde há maior disponibilidade de parceiros.
    Discutiu-se até a inclusão do transtorno da hipersexualidade na última edição do Manual de Estatísticas de Diagnósticos da Associação Americana de Psiquiatria, obra considerada como a "bíblia" da psiquiatria, mas a questão ficou de fora por falta de consenso sobre o tema.
    Pesquisadores mais ligados à dependência química veem o problema como vício sexual. Há quem trate a questão como transtorno obsessivo-compulsivo ou impulso sexual excessivo.
    O que há de comum são os relatos clínicos. O diagnóstico envolve a qualidade –e não a quantidade– dos encontros e a sensação de perda de controle. O sexo ocupa mais espaço do que a pessoa deseja e traz prejuízos à vida pessoal e profissional. Ela tenta reduzir a frequência das relações, sem sucesso.
    "É algo tão incontrolável como outros tipos de compulsão, como não parar de lavar as mãos. A diferença é o cunho moral, que torna o problema menos aceito na sociedade", diz Carmita Abdo, coordenadora do ProSex (Programa de Estudos em Sexualidade) da USP.
    O tratamento inclui psicoterapia individual ou em grupo, remédios para doenças mentais associadas e a tentativa de realocar o sexo na vida da pessoa, já que, diferentemente de outros vícios, o objetivo não é a abstinência.

    DEPOIMENTO
    'Já transei com morador de rua, com mulher feia por perversão'
    DE SÃO PAULO
    O professor A.L. tem 40 anos e frequenta um grupo de ajuda mútua para compulsivos por sexo.
    (GG)
    -
    "Minha mãe me botou para fora de casa aos 13 anos porque eu era rebelde. Passei a morar sozinho num imóvel da família. Muito largado, caí numa busca desenfreada por sexo que, mais tarde descobri, era pela falta de afeto.
    [Fazer sexo] era uma desculpa para buscar amor. Minha primeira vez foi com mulher. Eu era um adolescente inseguro e falhei nas três primeiras vezes. No mesmo ano, transei com um homem.
    Minha parte homossexual era detonada quando me sentia rejeitado pelo sexo oposto, era como se eu buscasse anulação da minha masculinidade.
    Aos 19, começou a compulsão: encontrava um cara e ia para a cama. Podia ser na rua, na casa, no cinema, num prédio que eu via que estava com a porta aberta. Eu entrava, às vezes bêbado, e dizia, direto: Vamos transar?'.
    Depois que acabava, sentia culpa. Eu me desculpava com a pessoa, saía dali e raramente pedia o telefone ou repetia a transa.
    Já transei com morador de rua. Já transei com uma mulher muito mais velha, que eu achava feia, grotesca. Fui pela perversão de transar com alguém [por quem] não sentia nenhuma atração.
    Ficava meses sem ir a um cinema pornô e de repente ia três dias seguidos, ficava quatro horas, fazia sexo mais de uma vez. Já houve briga por causa de sugestão sexual que não foi bem aceita pela outra pessoa. Já levei ameaça.
    A compulsão não se mede pela quantidade de pessoas com quem você faz sexo, mas pelo sofrimento que ela produz. Ela atrapalha a concentração mesmo quando você não está praticando sexo: você fica pensando num telefonema que vai receber, numa mensagem em rede social.
    Namoro uma mulher há dois anos. A tendência agora é ficar mais tranquilo. Tive uma recaída depois de uma briga e contei a ela. Sou fiel por algum tempo, mas não para sempre."

    DEPOIMENTO
    'Quanto mais parceiros eu tenho, mais vazio me sinto'
    DE SÃO PAULO
    O estudante universitário J.S., 34, frequenta reuniões do Dasa (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos) há oito meses.
    (GG)
    -
    "A compulsão sexual se desenvolveu em mim pela falta de autoestima. Aquela crença de que quanto mais mulher eu pegar, mais homem eu sou, quanto mais homem eu pegar, mais eu me sinto querido.
    Comecei minha atividade sexual aos 13 anos, com um menino. Depois foi com mulher, uma prostituta.
    Eu vivia no interior de Pernambuco. Tinha um vereador que morava na casa ao lado. Quando eu tinha 14 anos, ele começou a pedir que eu fosse dormir na casa dele sempre que a mulher dele ia para Recife. Eu, de família carente, entrei no jogo de sedução. Me tornei amante dele por cinco ou seis anos.
    Aos 18 vim para São Paulo. Comecei a usar drogas. Se caio na cocaína, vou parar em quarto com travesti ou assistindo a filme pornográfico a noite inteira.
    Fui morar em Buenos Aires e esse comportamento se intensificou. Lá eu tinha parceiro, mas me prostituía. Circulava à noite por Palermo e via gente transando embaixo das árvores, na frente de quatro, cinco pessoas. Um dia transei com um cara lá e chegaram três para assistir. Me excitei ainda mais.
    Agora estou com um parceiro. Mas não quero ficar só com ele. Juro fidelidade e faço o contrário.
    Ontem mesmo fui à subprefeitura, identifiquei de longe um gay e comecei a me insinuar. Botei a mão dentro da calça para atrair. Trocamos celular. Meu parceiro não sabe de nada.
    Nunca precisei transar com três no mesmo dia. Mas quero mais do que a pessoa com quem estou pode oferecer: quero outros, outras. Tenho muita libido, acho isso doente já.
    Estou cansado desse sofrimento. Quanto mais parceiros, mais vazio eu me sinto. Nesses dias, um amigo meu chegou e disse: Nossa, você é bonito'. Foi o suficiente para irmos ao motel, passarmos a noite toda lá e sairmos como se nada tivesse acontecido. Não quero mais isso."

    Rafael Garcia

    folha de são paulo

    Primeiro animal terrestre já tinha tração nas quatro patas


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    RAFAEL GARCIA
    DE SÃO PAULO

    O trio de paleontólogos que descobriu em 2006 o Tiktaalik roseae –peixe que originou os primeiros quadrúpedes terrestres– encontrou novos fósseis que revelam uma caraterística inesperada do animal. Ao contrário do que se pensava, ele já era capaz de se locomover caminhando com quatro membros, e não apenas dois.
    A descoberta foi descrita pelos cientistas em um estudo na edição de hoje da revista "PNAS". O trabalho apresenta pela primeira vez ossos bem preservados da pélvis da criatura, além de parte de suas barbatanas traseiras.
    Os novos fósseis do Tiktaalik, na verdade, foram "achados" dentro do laboratório, em blocos de pedra trazidos de um sítio paleontológico na Groenlândia que ainda não haviam sido escavados.
    Nos primeiros estudos sobre o animal, os paleontólogos Neil Shubin, Ted Daeschler e Farish Jenkins defendiam que a criatura tinha uma forma um pouco atrapalhada de se locomover sobre terra: usaria apenas os membros dianteiros, arrastando o resto do corpo atrás. Só depois é que a evolução teria produzido quadrúpedes de verdade.
    Editoria de Arte/Folhapress
    AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIA
    Essa outra hipótese fora criada porque não se conheciam fósseis da traseira do animal. Cientistas acreditavam que, por serem partes pequenas, eles teriam se deteriorado. O novo estudo sugere que o primeiro vertebrado terrestre já andava sobre as quatro patas.
    Tiktaalik viveu há 375 milhões de anos, cerca de 25 milhões de anos antes do aparecimento dos primeiros animais claramente terrestres. Seus hábitos ainda eram predominantemente aquáticos, mas suas barbatanas já começavam a ganhar características de patas. Provavelmente usava locomoção quadrúpede para atravessar águas rasas ou lamacentas.
    "Ele tem tanto traços em transição, algo esperado para uma linhagem levando aos animais com patas, quanto traços primitivos, que o conectam a seus precursores", disse à Folha Daeschler, da Academia de Ciências Naturais da Filadélfia.

    Vinicius Torres Freire

    folha de são paulo
    Um rolê pelo rolezinho
    'Movimento' está sendo adotado por militantes, mas tem algo de 'footing' e molecagem de férias
    O ROLEZINHO está prestes a se tornar uma grande causa célebre dos combatentes das efêmeras guerras culturais que têm transbordado das ruas para as "redes sociais" e vice-versa.
    Ou talvez a polêmica e o movimento já tenham chegado ao seu ápice. Teriam sido paixões transitórias como os confrontos em torno do deputado Feliciano e a "cura gay", do grande resgate de beagles, da irrupção do movimento ciclista, de cotas raciais etc.
    O rolezinho tornou-se motivo de outro conflito estereotipado entre "esquerda" e "direita". Seu "sentido é disputado", como se dizia dos protestos de junho, por comentaristas e ideólogos.
    De molecagem, no bom e no mau sentido, o "rolê" está sendo "ressignificado" como "Occupy Shopping" (como o protesto iniciado em Nova York contra a finança) ou como um paralelo de protestos que se ensaiam contra a Copa ("Não vai ter shopping", "Não vai ter Copa").
    Claro que a iniciativa significante não parte dos garotos do rolê, mas de gente de esquerda. Para essa vaga esquerda, a repressão do rolê, ilegal, é evidência de racismo e do apartheid informal do Brasil, outro momento em que a elite branca ruim revela seu horror a pobres e crioulos.
    Para a "direita", o movimento seria um transtorno ao comércio e à paz pública. Para transeuntes menos reflexivos, um proto-arrastão, coisa de "maloqueiros", típico insulto racista paulistano, adotado por todas as classes.
    O rolê que deu origem à série, em Itaquera, teria juntado (incríveis) 6.000 garotos num sábado, 7 de dezembro; teve momentos de tumulto e uns poucos furtos. Outros foram marcados e realizados em shoppings da periferia.
    Parecem juntar meninos que estudam numa Escola Estadual Professor Lonjura da Silva, adeptos de "street fashion" funk, "pardos" como a maioria de nós, em especial os mais pobres.
    As convocatórias dos rolês sugerem que a intenção dos adolescentes não difere muito daquela de quem fazia o "footing", o passeio rotatório nas praças de quase qualquer cidade entre os anos 1930 e 1960: namorar e fazer uma onda.
    "Vamos colar no shop amanhã gente tem nada memo pra fazer, meninas levar as amiguinhas e os mlk a mema fita vamo cata mulher, fuma uns beck ve quem nunca viu pessoalmente é isso", dizia a página do Facebook que convidava para um rolê.
    "Ai vamo colar, no shop sem esses arrastão ai sem maldade, colar pra fikar suave tirar foto pegar mulher fumar maconha, bebe, e é isso, vamo que vamo."
    "Catá mulher" e "fumá uns beck" não têm o ar provinciano e reprimido do "footing". Esses meninos são desencantados e cínicos em relação a suas expectativas reduzidas. Mas a ideia é a mesma, reciclada com os meios de um "flash mob" de 2003 ou de "primavera" política.
    À parte discussões legais, o fato é que o rolê ameaçou cruzar fronteiras definidas na "limpeza étnica" que reservou o centro paulistano para os mais ricos, "zoando" costumes exclusivistas, o que dá combustível para o típico confronto político destes dias, comportamental, que passa longe de economia e de "questões de Estado". Sabe-se lá se decola a "aliança" entre inconscientes de classe e ideólogos de esquerda. Mas desde 2013 há disposição para "causar".
    vinit@uol.com.br

      Clovis Rossi

      folha de são paulo
      Aiatolás na fortaleza capitalista
      O presidente do Irã vai a Davos, em mais um passo para sair de décadas de isolamento e sanções
      Antes mesmo de fechado, no domingo, o acordo sobre o programa nuclear iraniano, o presidente Hasan Rowhani já havia confirmado sua presença no convescote por excelência do capitalismo que é o encontro anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos.
      Sinal claro de que Rowhani está sendo fiel à sua pregação na campanha eleitoral, no sentido de que queria tirar o Irã do isolamento a que foi condenado pelas suspeitas em torno de seu programa nuclear.
      Imagino que Rowhani será recebido com tapete vermelho em Davos. A clientela essencial desses encontros são as grandes corporações multinacionais. Não há grife realmente importante que não mande representante a Davos.
      Até Dilma Rousseff, frequentemente acusada de desconfiar e/ou desprezar os capitalistas, decidiu comparecer neste ano e acompanhada por pelo menos três ministros (Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o chanceler Luiz Alberto Figueiredo e Marcelo Neri, ministro de Assuntos Estratégicos) mais Luciano Coutinho, presidente do BNDES, Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, e uma delegação de cinco representantes da Petrobras, chefiada pela presidente Graça Foster.
      Não deixa de ser paradoxal que o governo brasileiro, que vem respeitando há pelo menos 20 anos os cânones do capitalismo, precise deslocar-se a Davos para vencer resistências, ao passo que o Irã, cujo confronto com o Ocidente é o mais agudo de todos os países mais ou menos relevantes, se faz cortejar.
      Afinal, o acordo sobre o programa nuclear promete pôr fim às sanções impostas ao Irã, o que significa que se abrem perspectivas de bons negócios --e bons negócios é a grande linguagem de Davos.
      Por isso, é razoável supor que outro chefe de governo que confirmou presença, o israelense Binyamin Netanyahu, seja recebido mais friamente se levar a Davos, como parece inevitável, suas restrições ao acordo nuclear com o Irã e, por extensão, ao levantamento das sanções.
      Por mais que os homens de negócio prefiram Israel aos aiatolás, prevalece, neste particular momento, a avaliação que faz Ray Takyeh, analista-sênior do Council on Foreign Relations: "Uma vez que os dois lados concordaram sobre o dossiê nuclear, talvez possam mover-se em direção a uma cesta mais ampla de cooperação".
      Negócios à parte, há um território em que o Ocidente e o Irã têm interesses comuns: combater os extremistas sunitas que estão ativos principalmente no Iraque e na Síria.
      O interesse do Irã é óbvio: manter e fortalecer o eixo xiita Teerã/Bagdá/Damasco, com ramificação no Líbano. O do Ocidente é o de evitar que a Al Qaeda preencha os vazios deixados pela dificuldade dos EUA em ditar os rumos no Oriente Médio ou no mundo muçulmano mais abrangentemente.
      Mas as coincidências terminam aí. Afinal, escreve Takyeh, "o assalto do Irã à ordem árabe definirá os parâmetros da política do Oriente Médio por algum tempo à frente". O Ocidente terá que definir como lidará com esse assalto, agora que o Irã está saindo do isolamento.

      Prisões para quem? - Editorial Folha SP

      folha de são paulo
      Prisões para quem?
      Sistema carcerário brasileiro não cumpre sua missão; país precisa aprofundar debate sobre função das penas privativas de liberdade
      Para que servem as prisões?
      A pergunta precisa ser levada a sério. Deveria ser o ponto de partida de toda discussão a respeito do sistema carcerário brasileiro. De sua resposta depende o encaminhamento de soluções para monstruosidades como as registradas em Pedrinhas, maior penitenciária do Maranhão.
      Até o século 18, prevalecia a noção de que a finalidade das sanções penais era fazer o criminoso pagar por seus atos delituosos. Regras como "olho por olho, dente por dente" ou os castigos físicos impingidos nas masmorras medievais constituíam somente desdobramentos dessa tese.
      Desse ponto de vista, quem ainda hoje nega direitos humanos a delinquentes talvez entenda que ninguém deveria se preocupar com a selvageria dentro das cadeias; os maus-tratos seriam espécie de bônus não previsto no Código Penal.
      Mas entre os 548 mil indivíduos entulhados em 310 mil vagas sob a custódia do Estado brasileiro, 195 mil são presos provisórios --sem condenação definitiva. Além disso, calcula-se que mais de 5% estejam indevidamente encarcerados.
      Mesmo que sevícias ainda fossem aceitáveis nas democracias atuais, seria forçoso reconhecer que, nas penitenciárias brasileiras, o suplício não preserva nem pessoas que podem ser inocentes.
      A humanidade, felizmente, avançou muito desde o final da Idade Média. O Estado moderno não abre mão --ao menos em teoria-- de proteger os direitos humanos de todos, indistintamente.
      No que respeita às sanções penais, também houve notáveis progressos. Ao caráter punitivo acrescentaram-se três funções: evitar novos danos à sociedade; dissuadir outros cidadãos de cometer um delito; ressocializar o criminoso.
      Não é preciso esforço para notar que o sistema carcerário brasileiro é mais medieval do que moderno.
      As punições, no cotidiano prisional, extrapolam o aceitável e não guardam proporção com o crime cometido. Há muito tempo o horror das cadeias é descrito em relatórios da ONU e do Conselho Nacional de Justiça, mas o vídeo divulgado por esta Folha com imagens de Pedrinhas mostrou que qualquer adjetivo é mero eufemismo.
      Chega a ser surreal esperar ressocialização após uma temporada numa instituição mais propensa a retirar dos prisioneiros o que lhes resta de humanidade. As penitenciárias são antes escolas do crime, e estima-se que mais de 60% dos detentos retornem a elas.
      Diante de reincidência tão elevada, soa pueril falar em dissuasão. De resto, a certeza da condenação presta-se mais a esse propósito do que a gravidade da pena. No Brasil, porém, menos de 10% dos homicídios resultam em prisão.
      Sobraria ao cárcere a função de afastar bandidos do convívio social, protegendo os demais cidadãos. Mas nem isso ocorre. Partem, de dentro das celas, ordens de comando para ações criminosas nas ruas, como o ataque cruel que matou Ana Clara, 6, na região metropolitana de São Luís.
      As prisões, como se vê, têm servido para muito pouco, ou nada.
      O momento é oportuno para discutir uma reorientação radical do sistema. Esta Folhatem defendido há mais de uma década que as penas privativas de liberdade deveriam ser reservadas apenas a infratores que empreguem violência ou grave ameaça em seus crimes.
      A tese pode causar surpresa, mas seu fundamento é racional. Baseia-se no princípio de que o encarceramento só é necessário a fim de apartar indivíduos violentos da sociedade, interrompendo a ameaça que representam; nos demais casos, as funções da pena deveriam ser atendidas com medidas de natureza menos medieval.
      A punição pode ocorrer na forma de multa, restrições de direitos (impedimento de viajar ou de exercer uma atividade, por exemplo) e sanções alternativas --desde que suficientemente duras e proporcionais ao delito.
      Além de implicarem uma retribuição social inexistente na prisão, as alternativas penais, segundo diversos estudos, são muito mais eficientes para prevenir novas infrações, com índice de reincidência oscilando entre 5% e 12%.
      O custo também é muito menor. Um preso comum não sai por menos de R$ 24 mil/ano (sem contar a construção de presídios, que demanda R$ 33 mil por vaga); o gasto anual com pena alternativa pode ficar abaixo de R$ 500 por pessoa.
      Some-se ainda outra vantagem: a diminuição da população carcerária, tornando mais fácil monitorar os prisioneiros. Como consequência, facções criminosas seriam afetadas, já que a superlotação é benéfica para elas. Hoje, indivíduos pouco perigosos terminam, voluntariamente ou à força, servindo aos interesses dos chefes dentro das cadeias.
      Não há, portanto, razão para manter o sistema prisional brasileiro inalterado. Dos pontos de vista pragmático e filosófico ou da perspectiva dos direitos humanos, sobram motivos para o país iniciar um novo debate sobre o tema.

        Eliane Cantanhêde

        folha de são paulo
        "Rolezinho" na elite
        BRASÍLIA - Assim como poderosos em geral, políticos em particular e a mídia se surpreenderam com as manifestações de junho de 2013, ninguém sabe agora como agir diante dos "rolezinhos". Isso vai longe.
        As manifestações embolaram ricos e classe média, velhos e jovens, letrados e uma minoria arruaceira. O movimento paulista é de jovens de periferia que nem são adolescentes em situação de risco, que roubam tênis de R$ 500 dos "riquinhos", nem se contentam em serem olhados como cidadãos de segunda categoria. Querem igualdade, ocupar espaços, gritar e ser ouvidos.
        Os que invadiram as ruas --contra o aumento de tarifas de ônibus e/ou por exaustão contra a corrupção e as mordomias - foram recebidos com perplexidade, depois borrachadas, e só cresceram. Deixaram seu recado, retiraram-se quando os vândalos ocuparam a cena pública e continuam assombrando o sono da presidente, de governadores e prefeitos.
        Os que agora invadem os shoppings contra a discriminação e o preconceito refletem a grande maioria e se organizam, também sem líderes, para "zoar, dar uns beijos, rolar umas paqueras" ou "tumultuar, pegar geral, se divertir, sem roubos". Ou seja: botar a cara de fora, curtir as férias e dividir o ar condicionado. Também foram recebidos com perplexidade, agora com borrachadas e tendem a se multiplicar por outros Estados.
        Não administro shoppings, não tenho loja nem moro em São Paulo, mas, à distância, acho inacreditável a reação contra a garotada e os "rolezinhos". Proibir aglomeração em locais públicos? Fazer triagem? Jogar a polícia em cima? Reprimir com cassetete? É lenha na fogueira.
        Se alunos de bairros ricos (que não têm mais a ALN, a Polop, o partidão, nem ditadura, para protestar) decidirem aderir, vai ficar engraçado. Mesmo que não, como deixar uns entrarem e os outros não nos shoppings? Pela cor, roupa, sapato ou o jeitão? Talvez os cifrões na carteira...
        Não vai dar certo. E a Copa vem aí.

          Carlos Heitor Cony

          folha de são paulo
          Do diário de um seminarista
          RIO DE JANEIRO - Grave incidente para perturbar a nossa tranquilidade, provocado pelo próprio senhor arcebispo. Veio enfurecido do palácio, para desabafar aos gritos com os nossos superiores, que nada tinham a ver com a história.
          Padre João Carlos, que fora nosso professor de latim no seminário menor, e mais tarde feito coadjutor de uma das melhores paróquias da cidade, largou a batina. Não sem antes escrever uma carta desaforada e injusta para seu superior.
          Parece que a carta, mais que a apostasia em si, doeu em sua excelência. Daí seus berros. Enfurecido pelos próprios gritos, derivou a exasperação para o resto de todo o clero. Foi então um revolver de roupa suja desagradável para todos, padres e alunos.
          Em outro ponto o senhor arcebispo, além de inoportuno, foi grosseiro. Não resta dúvida de que certa parte do clero, trazida pelo falecido cardeal, goza hoje de alguns privilégios. Mas por acaso sua excelência não trouxe uma cambada de vigaristas que desde já usufruem de vida palaciana, sem nada quererem com o trabalho? Aqui mesmo no seminário temos exemplos dessas proteções.
          Teve um mérito isso tudo: abriu-me os olhos.
          Descubro que jamais me submeterei aos métodos do senhor arcebispo. Jamais o terei como chefe e pastor. Não posso me ordenar padre sob o jugo de semelhante homem. Não lhe faltam qualidades. Um ardor sacerdotal a toda prova, um senso muito elevado de suas responsabilidades e de seus deveres. Notável, quase sobre-humana, sua capacidade de trabalho.
          Mas é um homem falho de certa aura humana, de certa humildade pessoal. Nela coabitam dois profissionais: o sacerdote de Deus e o militar fracassado. E é uma lástima quando o homem de Deus é dominado pelo sargento que adora o poder e odeia a humanidade.

            Vladimir Safatle

            folha de são paulo
            O Estado
            Poucos problemas político-filosóficos têm o dom de produzir tantos conflitos quanto aquele a respeito da função do Estado. A divisão entre os que querem pensar uma sociedade sem Estado e os que não veem sentido algum nessa empreitada ultrapassa a dicotomia tradicional entre esquerda e direita. De toda forma, qualquer reflexão possível sobre o Estado na política contemporânea deve partir da internalização das críticas por ele sofridas nos últimos quarenta anos.
            Várias delas insistiam no Estado como aparato disciplinar responsável pela perpetuação de uma vida social normatizada na figura do direito. O cidadão do Estado era, acima de tudo, alguém que deveria se conformar a um aparato normativo legal e uniformizador a fim de ser reconhecido como pessoa capaz de contrair contratos, assumir propriedades, direitos positivos, deveres e funções sociais.
            A crítica, peça maior de uma teoria renovada do poder, era pertinente. No entanto, ela não implicava, necessariamente, o abandono do reconhecimento do Estado como instituição política central, mas, sim, sua metamorfose. Pois seu puro e simples abandono trazia problemas insolúveis.
            Não queremos apenas a possibilidade de se desenvolver como singularidades, queremos ser reconhecidos enquanto singularidades. Mas não quero ser reconhecido apenas na minha comunidade, entre os meus amigos. Quero ser reconhecido em todo e qualquer contexto social do qual participo e porventura participarei.
            Abre-se assim uma dimensão de demanda de universalidade que nos impulsiona em direção a um arranjo institucional de garantias de reconhecimento que nos leva, necessariamente, a um conceito pós-nacional de Estado. Sem tal arranjo, demandas dessa natureza perdem seu direito.
            Por outro lado, a atividade econômica é produtora de desigualdades. A ampliação da posse comum minora tais desigualdades, mas uma defesa abstrata do fim da propriedade apenas faria com que o desejo de individualização presente na propriedade se voltasse contra o espaço comum. Hegel era suficientemente astuto para perceber que a propriedade não era o problema, mas sua generalização a toda a esfera social e sua transformação em direito fundamental acima de todos os outros.
            Mas que instituição tem a força de quebrar os interesses individuais no campo da economia a fim de impedir o desenvolvimento da desigualdade? Claro que poderíamos recorrer à teoria do Estado como agente da classe dominante, mas, mais de uma vez na história, foi a pressão das classes desfavorecidas sobre o Estado que quebrou tais interesses de classe. O que nos obriga a desenvolver, no mínimo, uma figura um pouco mais contraditória do Estado.

            Globo de Ouro aponta para recuperação de Hollywood - Raul Juste Lores; Mauricio Stycer

            folha de são paulo
            Globo de Ouro aponta para recuperação de Hollywood
            Sem franco favorito, premiação destacou variedade de bons filmes no ano
            Melhor drama, '12 Anos de Escravidão' perdeu em outras seis categorias; 'Trapaça' ficou com três prêmios
            RAUL JUSTE LORESDE WASHINGTONO pilequinho nada disfarçado de Jacqueline Bisset, 69, no palco do Globo de Ouro nos fez recordar por que essa cerimônia é tão mais leve e divertida que a do Oscar.
            Mas também serviu para comprovar que o cinema de Hollywood recuperou em 2013 parte da relevância perdida nos anos recentes.
            Neste ano, o cinema quase encostou no sucesso de crítica e público obtido nos últimos anos pela TV americana (ainda assim, a vitória da série "Breaking Bad" foi mais aplaudida que a de qualquer um dos filmes premiados).
            A ótima fase de Hollywood promete um Oscar competitivo, depois de diversos filmecos alçados a vencedor nas últimas edições do prêmio ("O Discurso do Rei", em 2011, "O Artista", em 2012).
            A premiação dos Globos foi picotada, sem um franco favorito. "12 Anos de Escravidão" --o melhor do ano, mas pesado para fazer grande bilheteria--, levou o prêmio de melhor drama, mas perdeu em todas as outras seis categorias a que concorria.
            O drama espacial new-age "Gravidade", que arrecadou muito e concorria com quatro indicações, saiu com um único prêmio também, de melhor diretor para o mexicano Alfonso Cuarón.
            "Trapaça", farsa inspirada em caso real dos anos 1970 que uniu agentes do FBI e escroques em Nova Jersey, levou melhor comédia/musical e rendeu prêmios para as atrizes Amy Adams e Jennifer Lawrence. A comédia concorria em sete categorias.
            PEQUENO
            Até um filme pequeno como "Clube de Compras Dallas", sobre a história real de soropositivos que contrabandeavam remédios não autorizados para tratar a Aids nos anos 1980, ganhou os prêmios de melhor ator e coadjuvante (Matthew McConaughey e Jared Leto, dois casos de "volta por cima").
            "O Lobo de Wall Street", "Blue Jasmine" e "Ela" receberam um Globo cada. E vários filmes dessa ótima safra saíram de mãos vazias: "Nebraska", "Inside Llewyn Davis", "Philomena" e outros, como "Fruitvale Station", sequer foram indicados.
            A TV é que precisa dar uma chacoalhada, depois de temporadas menos boas de "Homeland", "Girls", "Downton Abbey", "Modern Family", "True Blood" e "Mad Men", ignoradas na premiação. Faltam mais séries com o impacto pop-cultural de "Seinfeld", "A Sete Palmos", "Sex and the City" e "The West Wing".
            Se "Breaking Bad" levou várias temporadas para conquistar o reconhecimento atual, que venham logo as próximas de "The Americans", "House of Cards", "The Newsroom" e "Game of Thrones".
              ANÁLISE
              Apresentadoras fazem cerimônia virar um stand-up inteligente
              Tina Fey e Amy Poehler aproveitam clima descontraído e não perdoam nem medalhões como Scorsese e DiCaprio
              MAURICIO STYCERCOLUNISTA DA FOLHAApresentando a festa pelo segundo ano, as comediantes Tina Fey e Amy Poehler estão conseguindo mudar a imagem do Globo de Ouro. Esqueça esta bobagem de "termômetro do Oscar" e preste atenção nas piadas.
              A premiação dos jornalistas estrangeiros em Hollywood virou um dos melhores shows de stand up da praça.
              Na comparação com o Oscar ou o Emmy, além de demorar menos, o Globo de Ouro sempre foi famoso por ser a festa de premiação durante a qual bebidas alcoólicas são servidas. Ou seja, sempre foi uma cerimônia mais descontraída. Mas com as duas comediantes na apresentação se tornou também palco de humor inteligente.
              Nas primeiras três frases da festa de 2014, as duas já tinham gargalhado do nome do prêmio, do público que assiste em casa pela TV e de atores candidatos ao prêmio.
              Não faltaram ironias com os principais filmes. "Se eu quisesse ver [o ator] Jonah Hill se masturbar numa festa na piscina, eu iria a uma festa na piscina de Jonah Hill", disse Amy Poehler, realçando o exagero de uma das muitas cenas de sexo no filme "O Lobo de Wall Street".
              Tina Fey explicando "Gravidade", protagonizado por Sandra Bullock e George Clooney, resumiu: "É a história de como George Clooney prefere flutuar no espaço e morrer a passar mais tempo com uma mulher da sua idade."
              Ou falando de Matthew McConaughey: "Para seu papel em Clube de Compras Dallas', ele perdeu 20 quilos --ou o que as mulheres chamam de estar em um filme".
              É curioso notar como os próprios atores se sentem mais à vontade no Globo de Ouro --talvez, justamente, por ser menos importante.
              Quem viu pelo TNT, no Brasil, se divertiu com a falta de censura sonora aos palavrões (alguns deles cortados pela NBC na transmissão para os Estados Unidos), ditos por Jacqueline Bisset, Elisabeth Moss e, em especial, Aaron Paul, que repetiu um dos bordões picantes de seu personagem em "Breaking Bad".
              Na melhor tradição do "Saturday Night Live", em que ambas trabalharam por muitos anos, com enorme sucesso, o stand-up do Globo de Ouro não poupou nenhum medalhão, incluindo Woody Allen, Martin Scorsese, Meryl Streep e Leonardo DiCaprio.
              Tina e Amy conseguiram fazer da cerimônia um bom programa mesmo para quem não está nem aí para a premiação. Não é pouca coisa.
                LÍNGUA AFIADA
                "É a história de como George Clooney prefere flutuar no espaço e morrer a passar mais tempo com uma mulher de sua idade"
                TINA FEY
                humorista, falando de "Gravidade" na abertura da premiação
                "Eu quero agradecer às pessoas que me deram felicidade, e elas foram muitas. E às pessoas que me trataram como merda, eu digo como a minha mãe: vão para o inferno e não voltem"
                JACQUELINE BISSET
                atriz, melhor atriz coadjuvante por "Dancing on the Edge"
                "Obrigada por me encherem de vodca do mesmo jeito que Judy Garland era abastecida com barbitúricos"
                CATE BLANCHETT
                atriz vencedora por "Blue Jasmine", agradecendo aos colegas de mesa
                  FORA DO ROTEIRO
                  SEM GRAÇA
                  O canal E! Entertainment pediu desculpas ao ator Michael J. Fox por ter exibido como um dos "dados divertidos" que a doença de Parkinson do ator foi diagnosticada em 1991.
                  SEM PALAVRAS
                  Pega de surpresa com o prêmio de melhor atriz coadjuvante em série por "Dancing on the Edge", a britânica Jacqueline Bisset ficou nervosa e demorou a engatar o discurso.
                  SEM BEIJO
                  O rapper P. Diddy tentou cumprimentar com um beijo o cantor Bono, do U2, mas o irlandês virou o rosto. A cena se tornou meme nas redes sociais.
                  SEM PERDÃO
                  Enquanto Woody Allen era homenageado, o filho Ronan Farrow o criticava no Twitter. "Eles mencionaram a parte em que uma mulher confirmou publicamente ter sido molestada por ele aos 7 anos antes ou depois de Annie Hall'?", escreveu, em referência à irmã Dylan. A ex-mulher Mia Farrow também tuitou: "Hora de pegar um sorvete e mudar para Girls'".

                    José Simão

                    folha de são paulo
                    Ueba! Cauã em Amores Pelados!
                    E o Tufão é corno de novo?! O Murilo Benício devia mudar de nome pra MUGIDO Benício! Rarará!
                    Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E o rolezinho? Como diz o tuiteiro webtoc: "Quando for ao shopping JK nunca diga que vai comprar um rolexzinho". Aliás, em shopping algum. Seria pânico geral! Causa mais pânico que uma invasão de baratas carnívoras dilaceradoras de vísceras! Rarará!
                    E eu tô adorando a minissérie "Amores Roubados"! Ops, Amores Pelados! A história de um comelão! O Cauã Reymond é o sucessor do Zé Mayer! E o site noveludo traz o resumo de "Amores Roubados". É a foto do Cauã gritando: "EU VÔ TI CUMÊ!". Pronto, esse é o resumo da minissérie: "EU VÔ TI COMÊ!" E a mulherada: "PÓ COMÊ!".
                    Primeiro capítulo: "Eu vô ti come, pó comê!". Segundo capítulo: "Eu vô ti comê, pó comê!". Terceiro capítulo: "Eu vô ti comê", e a Cassia Kis: "Mas eu sou a sua mãe!". Rarará!
                    E sabe por que a minissérie tem intervalo? Pro pinto do Cauã esfriar! E o Tufão é corno de novo?! O Murilo Benício devia mudar de nome pra MUGIDO Benício! MÚUUUUgido Benício! Rarará! Estão todos INTERTREPANDO muito bem. E a fotografia é linda. E Patrícia Pillar e Dira Paes, sensacionais!
                    E atenção! Maranhão Urgente! Manchete do Piauí Herald: "Roseana Sarney manda beijinho no ombro para os recalcados". E a foto dela vestida de Valesca Popozuda? O tigre do clipe tem um bigodão! Rarará! E continuo fascinado pela quentinha da Roseana: lagosta, champanhe, uísque e caviar. Maranhão vira Lagostão! Rarará!
                    E a charge do Samuca: "E aí, filhona, apurando os crimes?". "Primeiro me passa o caviar." Rarará! E o Sarney: "Tudo culpa do meu antecessor". "Quem?" "Dom Pedro 2º." Ops, Pedro Álvares Cabral. O antecessor do Sarney foi Pedro Álvares Cabral, quando gritou: "Sarney à vista". Outros acham que o antecessor do Sarney foi Tupã!
                    E na França, em 1890, teve uma epidemia chamada Epidemia do Bigode. E aí nasceu a família Sarney. Família Sarney: os moribundos de fogo! Rarará! Donos do MYranhão!
                    É mole? É mole, mas sobe!
                    O Brasil é Lúdico! Olha esse cartaz no poste: "Sumo com a pessoa amada durante o Carnaval. Devolvo na quarta-feira de cinzas. Ligue já!". E um amigo ficou numa pousada no Nordeste com a seguinte placa: "Quem quiser café na cama que vá dormir na cozinha". Rarará.
                    Nóis sofre, mas nóis goza!
                    Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

                    A lição de Ariel Sharon - João Pereira Coutinho

                    folha de são paulo
                    A lição de Ariel Sharon
                    Nenhum outro premiê israelense fez na Faixa de Gaza exatamente aquilo que os palestinos reclamavam
                    Morre Ariel Sharon. Há festejos na Faixa de Gaza. Fato: não esperava que os palestinos chorassem a morte de um homem que fez da segurança de Israel a sua eterna paixão.
                    Primeiro, combatendo nas principais guerras que o país travou desde 1948. E, depois, elegendo a Organização para a Libertação da Palestina (e Arafat) como inimigo número um --um ódio pessoal que o levou à invasão do Líbano em 1982 e aos massacres nos campos de refugiados de Sabra e Shatila. Sharon não ordenou essas matanças de palestinos?
                    Novo fato. Mas não é preciso ser um gênio militar para perceber que, depois do assassinato de Bashir Gemayel, o líder dos cristãos do Líbano, haveria vingança pesada dos Falangistas sobre os palestinos que eles consideravam responsáveis pelo homicídio. Fechar os olhos a essas atrocidades é também uma forma de cumplicidade lamentável.
                    Acontece que os festejos em Gaza soam estranho quando nenhum outro premiê israelense fez no território exatamente aquilo que os palestinos reclamavam: retirada unilateral do exército de Israel.
                    Hoje, quando se fala dos "territórios ocupados", a Cisjordânia e os Montes Golã (na Síria) fazem parte do pacote. Mas a Faixa de Gaza, desde 2005, pertence aos palestinos porque Ariel Sharon decidiu terminar com uma ocupação de quase 40 anos, desmantelando milhares de colonos judeus na região.
                    Os motivos não foram beneméritos. A ocupação representava um desgaste internacional para Israel. Mas a principal razão era pragmática: Sharon entendeu que o "processo de paz" chegara ao fim.
                    Cinco anos antes, em Camp David, Israel estava disposto a concessões históricas impensáveis: o reconhecimento de um Estado palestino independente em Gaza e na Cisjordânia; a divisão de Jerusalém como capital dos dois Estados; e até o retorno de uma parcela de refugiados palestinos a Israel e compensações financeiras para os restantes (que viveriam, logicamente, no futuro Estado palestino).
                    Arafat, em gesto dificilmente classificável, exigiu o retorno de todos os refugiados a Israel (4 milhões), uma forma elegante de convidar o estado judaico a suicidar-se demograficamente (Israel tem uma população de 8 milhões, com 6 milhões de judeus e 1,5 milhões de árabes).
                    Depois do fracasso de Camp David, seguiu-se Ariel Sharon --uma escolha democrática que representa bem a desilusão da sociedade israelense com as negociações de paz.
                    E Sharon limitou-se a seguir a velha recomendação do general Yigal Alon, que depois da Guerra dos Seis Dias de 1967 alertara para os perigos de uma ocupação sem fim em Gaza e na Cisjordânia. Melhor seria controlar os territórios (de fora) sem governar milhões de palestinos hostis (por dentro). Ninguém o escutou. Só Sharon, 40 anos depois.
                    Dito e feito: Israel se retira de Gaza em 2005 e, no ano seguinte, o Hamas vence as eleições no território. Na imprensa "mainstream", o Hamas é apresentado como um grupo que luta contra a ocupação israelense. É uma forma de ver as coisas.
                    Outra é dizer simplesmente que se trata de um grupo terrorista que nega a existência da "entidade sionista"; que passou a usar Gaza como rampa de lançamento de "rockets" para o interior de Israel a partir de 2005; e que, também a partir desse ano, elegeu a Autoridade Palestina da Cisjordânia como "inimiga" fraternal. Tudo por causa da "traição" de Mahmoud Abbas em dialogar com Israel.
                    Hoje, não existe mais uma Palestina. Existem, pelo menos, duas: uma em Gaza, outra na Cisjordânia. Falar de um Estado palestino independente é uma piada de mau gosto quando os próprios palestinos não se entendem entre si.
                    Contas feitas, o que fica na morte de Sharon? Sim, um legado militar com páginas notáveis (lembrar a campanha do Sinai em 1967 contra o Egito) e as páginas negras (os massacres de Sabra e Shatila).
                    Mas, depois da retirada unilateral de Gaza, Sharon mostrou ao mundo que o conflito israelense-palestino não é territorial; é puramente ideológico. E que é inútil trocar terra por paz quando o interlocutor nem sequer reconhece o nosso direito à existência.
                    Os festejos de Gaza expressam isso mesmo: os palestinianos já têm um território autônomo, que poderia ser a base de um futuro Estado palestino. Mas o problema central continua o mesmo: o fato de os judeus também terem o seu Estado ali ao lado

                    Janio de Freitas

                    folha de são paulo
                    Marina, Eduardo etc.
                    A reunião de dirigentes do PSB sem a participação de Marina tem um ingrediente inegável de animosidade
                    O choque de objetivos se complica e se acirra entre Marina Silva e Eduardo Campos no PSB. Os grupos de ambos acusam a existência apenas de intrigas da imprensa, mas Eduardo Campos e sua corrente partiram para iniciativas que os recuperem da noticiada perda de força na sua relação com Marina Silva. Tudo sugere, porém, que as iniciativas adotadas não levarão ao resultado pretendido, e, sim, à permanência mais agravada do choque.
                    A maneira como Eduardo quis invalidar a recusa de Marina a apoiar a recandidatura de Geraldo Alckmin --doou ao PSDB uma secretaria e um cargo de segundo nível no governo de Pernambuco-- nem arranhou a intenção da Rede de lançar candidato próprio em São Paulo. E, atraindo peessedebistas de Aécio Neves para a sua candidatura, leva o comando nacional do PSDB a reagir com a proibição de acordos estaduais sem a sua concordância prévia. O que pode trazer danos indiretos ao PSB em outros Estados.
                    O entendimento com o PSDB de Pernambuco, sem entendimento a respeito com Marina, teve a desculpa de ser ato do governo. Já a planejada reunião, na próxima sexta-feira, de dirigentes do PSB sem a participação de Marina, tem, por si só, um ingrediente inegável de animosidade. E vai muito além disso, com os já antecipados propósitos de acelerar o compromisso de apoio à recandidatura de Alckmin e cravar Marina Silva como candidata a vice de Eduardo Campos.
                    Por ora, o pretendido avanço da corrente de Eduardo Campos parece pouco para demover Marina Silva de suas posições e propósitos. Mas suficiente para criar novos embaraços na relação em que Eduardo Campos ainda está por demonstrar algum ganho com sua apressada criação do PSB-Rede.
                    CRIMINOSOS
                    É esperada para hoje a divulgação do gordo dossiê que denuncia ao Tribunal Penal Internacional os crimes de morte, tortura e brutalidades sexuais cometidos por militares do Reino Unido, sobretudo ingleses e australianos, durante seis anos no Iraque ocupado. Se o tribunal tiver, enfim, a decência de efetivar um processo contra chefes políticos e militares de uma potência ocidental --o que a melhor imprensa europeia acha improvável-- veremos ministros e generais ingleses nos bancos dos réus.
                    Em certa medida, seria uma satisfação moral dada também ao Brasil. Quando se fala, aqui, dos crimes da ditadura, os ingleses jamais são citados. Muitos dos métodos torturantes de interrogatório e castigo aqui usados foram criados pela associação de ingleses e israelenses, como as maneiras de desestruturar mentalmente o preso, muitas vezes de modo irreversível. A exemplo das celas com sons altos e iluminação permanentes. Além das torturas físicas. Tudo adotado pelos ingleses para aplicar contra os irlandeses na segunda metade do século passado.
                    SEM IRONIA
                    Em carta de ontem no Painel do Leitor, o desembargador Rogério Medeiros Garcia de Lima, de Belo Horizonte, queixa-se dos leitores que o criticaram por sua carta anterior, contra a ministra Maria do Rosário, Paulo Sérgio Pinheiro, contra mim "e outros tantos admiráveis defensores dos direitos humanos no Brasil", por criticarmos as monstruosidades em presídio maranhense. Apenas, diz ele agora, "indaguei, com ironia, o que esses paladinos dos direitos humanos' têm a oferecer além de retórica e tinta de impressora".
                    Que coisa feia, um desembargador mentiroso. Leitores o criticaram por escrever, isso sim, a bobice de que cada um dos citados levasse "para casa um preso carente de direitos humanos". Sua carta nada "indagou", ou, em resposta, eu lhe ofereceria uma sugestão: tomar conhecimento da Constituição brasileira.

                    Tais como são, os 'rolezinhos' atentam contra direitos coletivos - MAURO RODRIGUES PENTEADO

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                    OPINIÃO
                    Tais como são, os 'rolezinhos' atentam contra direitos coletivos
                    MAURO RODRIGUES PENTEADOESPECIAL PARA A FOLHAPor mais que nos solidarizemos com nossa juventude humilde que busca espaços para se relacionar e dar vazão ao seu amor e alegria, não é possível apoiá-la nessa onda recente de "rolezinhos" marcados em shoppings centers e outros locais privados com destinação específica.
                    É triste a ausência de opção de lazer para nossos jovens de camadas mais pobres. No entanto, os "rolezinhos", tais como vêm sendo marcados, atentam contra os direitos individuais e coletivos assegurados pela Constituição Federal.
                    Isso sem falar no direito também constitucionalmente garantido à propriedade e à livre iniciativa (arts. 1º, inc. IV, 5º, "caput" e 170). Daí porque estão corretas as liminares concedidas pelo Judiciário aos shoppings --que estabeleceram multa aos participantes.
                    Os shoppings são empreendimentos privados abertos ao público especificamente para compras, lazer, diversão, passeio.
                    A maioria deles tem cinemas e praças de alimentação. Nenhum deles tem ainda uma "praça do rolezinho", modalidade de diversão muitas vezes conturbada por jovens infratores, ferindo o legítimo direito de pais, mães e filhos a um lazer sossegado e seguro que vão buscar nesses ambientes privados e protegidos.
                    Se o poder público não disponibiliza, como deveria, espaços próprios para o saudável congraçamento e encontro entre jovens, nem por isso os brilhantes moços que os organizam deixam de ter alternativas interessantes.
                    E todas elas são protegidas pela Constituição.
                    AVISO
                    O inc. XVI do art. 5º garante que "todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização", bastando "prévio aviso à autoridade".
                    Ora, por que não organizar os encontros no sambódromo ou outros locais públicos? Os convocados pela internet não vão faltar. Meninos e meninas levam o som, comidas e bebidas (sem álcool de preferência). Aí a festa será "legal", no duplo sentido: com muita animação e sem riscos de liminares e multas.
                    Juridicamente, basta os organizadores enviarem cópia da convocação à prefeitura e à Secretaria da Segurança.