terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Agências de espionagem usam 'apps' de celular para obter dados pessoais

Agências de espionagem usam 'apps' de celular para obter dados pessoais

James Glanz, Jeff Larson e Andrew W. Lehren
Quando um usuário de smartphone abre o popular aplicativo de jogo Angry Birds e começa a atirar pássaros contra porcos verdes, espiões podem estar espreitando ao fundo para captar dados que revelam a localização, a idade, o sexo e outras informações pessoais do jogador, segundo documentos secretos da inteligência britânica.
Em sua vigilância global contra suspeitos de terrorismo e outros alvos, a Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA na sigla em inglês) e sua homóloga britânica, Quartel-General de Comunicações do Governo (GCHQ na sigla em inglês), vêm tentando explorar um subproduto básico das telecomunicações modernas: a cada nova geração de tecnologia para telefones celulares, quantidades crescentes de dados pessoais são despejadas nas redes, onde os espiões podem obtê-los.
Ampliar

Espionagem pelo mundo52 fotos

1 / 52
9.jun.2013 - Edward Snowden, 30, ex-técnico da CIA que trabalhou como consultor da Agência Nacional de Inteligência (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, assumiu a responsabilidade pelos recentes vazamentos sobre a espionagem americana, conforme divulgou neste domingo (9) o jornal britânico "The Guardian" Leia mais Ewen MacAskill/The Guardian/AP
Segundo dezenas de documentos secretos só agora revelados, entre as mais valiosas dessas ferramentas de vigilância involuntária estão os chamados "apps vazadores", que espalham de tudo, desde as senhas de identificação dos usuários de smartphones até onde eles estiveram naquele dia.
A NSA e o GCHQ estavam trabalhando juntos sobre como coletar e armazenar dados de dezenas de apps de smartphones em 2007, segundo os documentos fornecidos por Edward Snowden, o ex-funcionário terceirizado da NSA. Desde então, as agências trocaram receitas para captar a localização e planejar dados quando um alvo usa o Google Maps, e para sugar dados de agendas de endereços, listas de amigos, registros de telefonemas (logs) e dados geográficos embutidos em fotografias quando alguém envia uma postagem para as versões para celular de Facebook, Flickr, LinkedIn, Twitter e outros serviços de internet.
A vigilância das redes de celulares foi destacada em relatórios anteriores, mas os documentos secretos compartilhados pelos jornais "The New York Times", "The Guardian" e "ProPublica" oferecem muito mais detalhes sobre suas ambições para smartphones e os apps que funcionam neles. Os esforços fizeram parte de uma iniciativa chamada de "enxurrada celular", segundo um documento britânico de 2011, uma analogia com as enxurradas de soldados enviados ao Iraque e ao Afeganistão. Um analista da NSA estava evidentemente entusiasmado ao dar o título de "Pepita de Ouro" a uma conversa altamente secreta em 2010 que descreveu os telefones iPhone e Android como ricos recursos, comentou outro documento.
A escala e a especificidade dos dados obtidos não estão claras. Os documentos mostram que a NSA e a agência britânica habitualmente obtinham informação de certos apps, especialmente alguns dos primeiros que foram introduzidos nos celulares. Com alguns apps mais novos, incluindo Angry Birds, as agências têm uma capacidade semelhante, segundo os documentos, que não explicitam se os espiões colocaram isso em prática. Alguns dados pessoais, desenvolvidos em perfis pelas companhias de publicidade, podem ser especialmente sensíveis: um documento da inteligência britânica de 2012 diz que os espiões podem vasculhar os apps de smartphones para coletar detalhes como a "tendência política" e a orientação sexual de um usuário.

ALVOS DE ESPIONAGEM

Telefonemas, e-mails e IPs de computadores de Dilma e assessores
Rede privada de computadores da Petrobras
Telefonemas e e-mails do Ministério de Minas e Energia do Brasil
Telefone celular da chanceler alemã, Angela Merkel
E-mail do ex-presidente do México Felipe Calderón
O presidente Barack Obama anunciou este mês novas restrições para proteger melhor a privacidade dos americanos e estrangeiros comuns da vigilância do governo, incluindo limites sobre como a NSA pode ver "metadados" dos telefonemas de americanos - a informação de roteamento, horários e outros dados associados às ligações. Mas ele não abordou a avalanche de informação que os órgãos de inteligência obtêm de apps vazadores e outras funções dos smartphones.
E embora ele tenha manifestado preocupação sobre companhias de publicidade que coletam informações sobre as pessoas para enviar anúncios sob medida para seus celulares, ele não deu pistas sobre se os espiões americanos obtiveram rotineiramente esses dados. Nada nos relatórios secretos indica que as companhias cooperaram com as agências de espionagem para compartilhar informação; o tema não é abordado.
As agências há muito tempo interceptam as primeiras gerações de tráfego de celulares, como mensagens de textos e metadados, de quase todos os segmentos da rede móvel - e, mais recentemente, tráfego de computadores que funcionam em "pipelines" da internet. Como essas mesmas redes carregam o fluxo de dados de apps vazadores, as agências têm uma maneira pronta de coletar e armazenar esse novo recurso. Os documentos não abordam quantos usuários poderiam ser afetados, se eles incluem americanos ou com que frequência, diante do volume de informação coletada automaticamente, os analistas veriam dados pessoais.

VEJA COMO O 11 DE SETEMBRO MUDOU A NSA

"A NSA não traça o perfil de americanos comuns enquanto realiza sua missão de inteligência estrangeira", disse a agência em uma resposta por escrito a perguntas sobre o programa. "Como alguns dados de norte-americanos podem às vezes ser incidentalmente coletados na missão de inteligência estrangeira legal da NSA, existem proteções à privacidade dos norte-americanos em todo o processo." Proteções semelhantes, segundo o órgão, estão implantadas para "cidadãos estrangeiros inocentes".
A agência de espionagem britânica não quis comentar qualquer programa específico, mas disse que todas as suas atividades obedecem à lei britânica.

Perfis detalhados

Os smartphones quase parecem tornar as coisas fáceis demais. Funcionando como telefones - para fazer ligações e enviar textos - e como computadores - surfar na web e enviar emails -, ambos geram e dependem de dados. Um relatório secreto mostrou que apenas ao atualizar o software Android um usuário envia mais de 500 linhas de dados sobre a história do telefone e sua utilização na rede.
Essa informação ajuda as companhias de publicidade para celular, por exemplo, a criar perfis detalhados das pessoas baseados em como elas usam seu equipamento celular, para onde viajam, que apps e sites elas abrem e outros fatores. As firmas de publicidade poderiam triangular dados de compras na web e a história de navegação para deduzir se uma pessoa é rica ou tem filhos, por exemplo.
A NSA e a agência britânica analisam diligentemente esses dados, garimpando-os em busca de novas informações e comparando-os com suas listas de alvos da inteligência.
Um documento britânico secreto de 2010 sugeriu que as agências coletaram um volume tão grande de "cookies" - os vestígios digitais deixados em um celular ou computador quando um alvo visita um site da web - que computadores secretos estavam tendo problemas para armazenar tudo.
"Eles são coletados em grosso e atualmente são nosso maior tipo de evento isolado", disse o documento.
As duas agências manifestaram um interesse particular pelo Google Maps, que tem precisão de alguns metros ou mais em algumas localizações. Os órgãos de inteligência coletaram tantos dados do app que "você poderia clonar a base de dados do Google" de pesquisas globais para obter endereços, segundo um relatório "top secret" da NSA de 2007.

Veja vídeos sobre o caso Snowden - 27 vídeos

"Isso significa efetivamente que qualquer pessoa que use o Google Maps em um smartphone está trabalhando para apoiar um sistema do GCHQ", diz um relatório secreto de 2008 da agência britânica.
(Em dezembro, o jornal "The Washington Post", citando os documentos de Snowden, relatou que a NSA estava usando metadados para rastrear localizações de celulares fora dos EUA e usava cookies de publicidade para conectar endereços de internet com localizações físicas.)
Em outro exemplo, um relatório secreto britânico de 20 páginas datado de 2012 incluía o código de computador necessário para retirar os perfis gerados quando usuários de Android jogam Angry Birds. O aplicativo foi criado pela Rovio Entertainment, da Finlândia, e foi baixado mais de um bilhão de vezes, segundo a companhia.
A Rovio atraiu críticas do público em 2012, quando pesquisadores afirmaram que o aplicativo rastreava a localização dos usuários e obtinha outros dados que transferia para empresas de publicidade para celulares. Em uma declaração em seu site na web, a Rovio diz que pode coletar dados pessoais de seus usuários, mas que obedece a algumas restrições. Por exemplo, diz o comunicado, "a Rovio não coleta informação pessoal de crianças com menos de 13 anos".
Ampliar

Tumblr 'Obama está lendo seu e-mail' ironiza espionagem digital dos EUA 19 fotos

1 / 19
Com a divulgação de que o governo dos Estados Unidos tem acesso a dados privados de usuários (como conversas telefônicas ou mesmo e-mails), internautas começaram a fazer montagens brincando com essa situação. Um dos mais famosos é o tumblr "Obama is checking your e-mail" (Obama está checando seu e-mail), que mostra imagens do político (geralmente em compromissos oficiais) vendo telas de computador em diversas ocasiões. A brincadeira é dar a impressão de que Obama está está "xeretando" a vida digital dos internautas Reprodução/obamaischeckingyouremail.tumblr.com
O relatório secreto notou que os perfis variam dependendo de quais companhias de publicidade - que incluem serviços de anúncios da Burstly e da Google, duas das maiores empresas de publicidade online - os compilam. A maioria dos perfis contém uma série de caracteres que identificam o telefone, juntamente com os dados básicos do usuário como idade, sexo e localização. Um perfil nota se o usuário está atualmente ouvindo música ou fazendo uma ligação, e outro tem uma entrada para a renda familiar.
A Google não quis fazer comentários para este artigo, e a Burstly não respondeu a diversos pedidos para comentar. Saara Bergstrom, uma porta-voz da Rovio, disse que a companhia não tem conhecimento de programas de inteligência. "Tampouco temos qualquer envolvimento com as organizações que você mencionou", disse Bergstrom, referindo-se à NSA e à GCHQ.
Ampliar

Polêmicas, gafes e (quase) incidentes diplomáticos entre Brasil e EUA10 fotos

7 / 10
Conversa pré-G20 - Em 5 de setembro, a presidente Dilma Rousseff e o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se encontraram antes da cúpula do G20, na Rússia, para discutir as denúncias de espionagem. Dilma afirmou que Obama se comprometeu a dar explicações ao governo brasileiro sobre as denúncias de espionagem contra o governo Grigory Dukor/Reuters
Outra companhia de publicidade cria perfis muito mais intrusivos que as agências podem recuperar, diz o relatório. Os apps que geram esses perfis não foram identificados, mas a empresa foi identificada como a Millenial Media, que tem sede em Baltimore (EUA).

Montanhas de dados

As agências tiveram sucesso ocasional - pelo menos os que elas admitem - quando começam algo mais próximo de uma pista investigativa tradicional. Os espiões dizem que rastrear o tráfego de smartphones ajudou a frustrar um atentado a bomba da Al Qaeda na Alemanha em 2007, e a NSA afirmou que para desvendar o plano ela juntou dados de celular com e-mails, logs de registro e tráfego na web. De maneira semelhante, garimpar dados de smartphones ajudou a levar à prisão membros de um cartel da droga no caso de assassinato em 2010 de um funcionário de um consulado dos EUA no México.
Mas os dados, cujo volume está crescendo conforme os equipamentos celulares começam a dominar a paisagem tecnológica, é uma montanha de informações para os espiões peneirarem. Enquanto os dados de smartphones se acumulam em bancos de dados da NSA e da GCHQ, as agências às vezes parecem um pouco perdidas sobre o que fazer com tudo isso, como mostram os documentos. Alguns experimentos isolados fornecem sugestões de como eles podem ser incômodos.
Em 2009, as agências americana e britânica realizaram separadamente uma análise de força bruta de uma pequena fatia de seus bancos de dados de celulares. Processar apenas um mês de dados de celulares da NSA, segundo um relatório secreto, exigiu 120 computadores e apresentou 8.615.650 "atores' - aparentemente usuários que tinham algum interesse. Um processo semelhante usando três meses de dados britânicos apresentou 24.760.289 atores.
"Não é necessariamente simples", disse o relatório sobre a análise. As extensas operações de computadores das agências tiveram dificuldade para classificar essa fatia de dados. Analistas estavam "lidando com imaturidade", disse o relatório, encontrando problemas de memória e processamento dos computadores. O relatório não mencionou nada suspeito nessas montanhas de dados.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Declaração de mergulhador olímpico reacende debate sobre bissexualidade

Declaração de mergulhador olímpico reacende debate sobre bissexualidade

na folha de são paulo

"É claro que ainda gosto de garotas."
Essa foi uma das frases mais comentadas de um vídeo de Tom Daley que circulou no YouTube no mês passado, em que o mergulhador olímpico britânico de 19 anos anunciou que está namorando um homem.
Ele continuou: "Mas, quero dizer, neste momento estou namorando um cara e não poderia estar mais feliz".
A mensagem de Daley foi simples e singela, e os defensores dos direitos gays pareceram entusiasmados ao receber em suas fileiras um atleta assumido. (Os comentários mais ferinos vieram depois, quando o "cara" foi identificado pelos tabloides como o roteirista Dustin Lance Black, que é 20 anos mais velho.)
Mas Daley nunca usou a palavra "gay", e há a questão de ele ainda gostar de garotas.
Toby Melville/Reuters
O mergulhador Tom Daley namora um homem, mas ainda gosta de garotas
O mergulhador Tom Daley namora um homem, mas ainda gosta de garotas
A revelação de Daley reacendeu um debate intenso na comunidade de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT).
A bissexualidade, assim como a síndrome da fadiga crônica, é muitas vezes considerada imaginária pelos que estão do lado de fora. Estereótipos não faltam: os bissexuais são promíscuos, mentirosos ou vivem "em negação". Eles são gays que não conseguem admitir sua sexualidade ou "lésbicas até a formatura" que estão procurando maridos.
"Essas reações são clássicas. Muitas pessoas não acreditam que a bissexualidade realmente existe e a consideram uma etapa transitória ou uma forma de 'estar no armário'", disse Lisa Diamond, professora na Universidade de Utah que estuda orientação sexual.
Estudos baseados na população, disse a doutora Diamond, indicam que a bissexualidade é mais comum que a atração exclusiva pelo mesmo sexo e que a libido feminina é especialmente aberta. Isso talvez explique por que a bissexualidade feminina é mais comum na cultura popular, desde "I Kissed a Girl", de Katy Perry, ao seriado "Orange Is the New Black", do Netflix.
Em um ensaio no "New York Times", no qual revelou seu relacionamento com outra mulher, a atriz Maria Bello escreveu: "Meu sentimento sobre ligação e parceria sempre foi de que eles são fluidos e evoluem".
Antes de se casar com Bill de Blasio, Chirlane McCray se identificava como lésbica, o que se tornou parte das credenciais progressistas da família do prefeito de Nova York.
A bissexualidade masculina, em comparação, é mais criticada, e grande parte do ceticismo vem dos homens gays.
O guru gay conservador Andrew Sullivan, em seu blog "The Dish", chamou a alegação de Daley sobre gostar de garotas de "um clássico mecanismo para facilitar a transição para sua verdadeira identidade sexual. Eu sei porque também fiz isso".
As lésbicas também podem ser temerosas. Mesmo depois que McCray se casou com De Blasio, algumas de suas "amigas lésbicas-separatistas", como disse a revista "New Yorker", recusaram-se a aceitar sua nova vida.
Esses pensamentos irritam os defensores da bissexualidade, que veem o viés contra os círculos gays como evidência de "bifobia". Muitas críticas neste sentido foram dirigidas ao colunista sexual Dan Savage. Em 2011 o blogueiro Chris O'Guinn acusou Savage de dizer "coisas claramente cruéis e insultantes sobre os bissexuais", incluindo seu comentário no documentário "Bi the Way", que dizia: "Quando conheço alguém que tem 19 anos e me diz que é bissexual, digo: 'Sim, tudo bem, eu duvido. Volte quando você tiver 29 anos e veremos'."
Savage respondeu com um vídeo para o "The Dish" no último verão. "Reconhecer que isso é uma coisa que acontece, que as pessoas brevemente se identificam como 'bi' antes de se assumirem como gays muitas vezes –nem todas as pessoas bi, mas os gays fazem isso– não deve ser considerado bifobia."
Daley e Bello, nenhum dos quais usou a palavra "bissexual", falaram sobre o ardor incontrolável de um único relacionamento, em vez de uma mudança de identidade. (Bello se contentou em se chamar de "qualquer coisa".)
Apenas algumas celebridades adotaram o termo. A atriz Cynthia Nixon, que se casou com uma mulher depois de ter filhos com um homem, disse ao "Daily Beast" em 2012: "Eu não uso a palavra 'bissexual' porque ninguém gosta dos bissexuais. Todo mundo gosta de xingar os bissexuais".
Mas evitar rótulos tem sua própria história entre os ativistas gays, que contaram com a visibilidade como arma contra a intolerância.
Quando um entrevistador da "Essence" mencionou a palavra "bissexual" para a nova primeira-dama de Nova York, McCray respondeu: "Eu sou mais do que um simples rótulo. Por que as pessoas insistem em rotular onde nos situamos no espectro sexual? Os rótulos colocam as pessoas em caixas, e essas caixas têm a forma de caixões".
No caso de Daley, a diferença pode ser geracional. Pessoas mais novas talvez não deem valor a rótulos como "gay" ou "bissexual", quando as comunidades que eles descrevem não são mais tão marginalizadas.
"Entre a geração mais jovem, vi muito mais abertura sobre a bissexualidade tanto em homens como em mulheres e, com frequência, uma rejeição a todos os rótulos", diz a doutora Diamond. "Eles são mais abertos para a ideia de que 'a sexualidade é complexa, e, desde que eu saiba com quem eu quero dormir, não importa como me chamem'.''