segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Facção paulista gerencia negócios do crime no Rio

folha de são paulo
Em reuniões com traficantes, PCC define envio de armas, dinheiro e drogas
Influência cresceu tanto que paulistas convenceram cariocas a vender crack, droga que evitavam nas favelas
MARCO ANTÔNIO MARTINSDO RIOJOSMAR JOZINODO AGORAO PCC (Primeiro Comando da Capital) chegou ao Rio. A facção criminosa paulista, que já montou bases em 13 Estados e até no exterior, se aproximou das três facções cariocas e passou a cuidar de negócios do crime no Estado.
A colaboração entre quadrilhas dos dois Estados ocorre eventualmente há anos, mas agora os criminosos de São Paulo são presença constante em reuniões do CV (Comando Vermelho), da ADA (Amigos dos Amigos) e do TC (Terceiro Comando) no Rio.
Nelas, definem o envio de armas, dinheiro e drogas.
A influência cresceu tanto que os paulistas conseguiram convencer os cariocas a vender crack, droga que sempre evitaram nas favelas do Rio.
Em dificuldades financeiras desde os ataques de 2006, quando passou a ser estrangulado pela polícia, o PCC diversificou sua atuação.
No Rio, a ação mais efetiva vem sendo feita junto ao CV. A facção carioca teve dívidas de R$ 7 milhões perdoadas e alguns já batizam essa união de CV-Primeiro Comando.
Levantamento do Ministério Público paulista no sistema carcerário do Rio mostra que 38 internos cariocas já foram "batizados" pelo PCC --ou seja, passaram a integrar a facção. Há ainda 15 presos de São Paulo, ligados à quadrilha, cumprindo pena no Rio.
A preocupação de policiais e promotores dos dois Estados é que a parceria cresça.
A Secretaria de Segurança do Rio disse que "não comenta ou divulga informações sobre investigações". A de São Paulo não se pronunciou.
Até os criminosos do Rio estão preocupados com a presença do PCC. Os investigadores flagraram um recado do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-mar, pedindo aos chefes do PCC que não "convertessem" os traficantes cariocas.
A partir do cruzamento de dados obtidos por promotores e policiais foi possível descobrir planos do PCC no Rio.
Do presídio de Presidente Venceslau (611 km de SP), chefes da facção decidiram, em conferências por celular, os caminhos da ação no Rio.
Em 2010, o PCC tinha dívida de R$ 4,5 milhões devido a apreensões de armas e drogas pela polícia. A facção decidiu então que era preciso criar uma base no Rio.
Assim, chefes ficariam escondidos no Estado e poderiam, das ruas, decidir os rumos da quadrilha, retirando o foco dos comparsas presos. Falam até em investir R$ 1 milhão na compra de uma casa.
Os planos para o Rio foram definidos em conversas de até duas horas que mostram Marcos Herbas Camacho, o Marcola, e Roberto Soriano, o Tiriça, dois dos chefes que estão presos, iniciando os contatos com ADA e CV.
Tiriça chega sugerir a paz entre as facções do Rio. Os traficantes do TC resistem à união das facções, mas sugerem uma "trégua" nas invasões de territórios.
Em um dos contatos, em outubro de 2010, Tiriça conversa do presídio com o traficante Antonio Bonfim Lopes, o Nem da Rocinha, na época em liberdade --hoje está na prisão federal de Campo Grande (MS). Eles acertam a ida ao Rio de emissários do PCC.
Após a visita, em novembro, um traficante conversa por telefone com Tiriça e outros três do PCC sobre a ida ao Rio. "O negócio é fora do comum. O bagulho é chique, é chapa quente. É um país. Não consegui nem contar [os fuzis] do tanto que tem."
Não demorou para que, mensalmente, oito criminosos do PCC passassem a ir ao Rio para treinamentos de tiro com a ADA.
    Em conjunto, facções criam base fora do Rio
    Com apoio do PCC, Comando Vermelho montou centro para distribuir drogas em Itaboraí, na região metropolitana
    Paulistas fornecem a cariocas a cocaína, que é enviada depois em pó ou como crack para vários pontos da capital
    MARCO ANTÔNIO MARTINSDO RIOCom apoio do PCC, o Comando Vermelho montou uma base em Itaboraí, na região metropolitana do Rio. De lá, distribui cocaína e crack para diferentes partes do Rio.
    Em depoimento em setembro no Rio, o traficante Rodrigo Prudêncio Barbosa contou que a facção paulista fornece cocaína para a carioca.
    Parte é enviada a um laboratório clandestino num sítio na favela da Reta, em Itaboraí --a 5 km do Comperj, o complexo petroquímico que está sendo construído pela Petrobras com investimento estimado em R$ 20 bilhões.
    Lá, uma quantidade é preparada para ser vendida como pó; o restante vira pedras de crack. Ainda conforme o depoimento, a proprietária do sítio foi expulsa dali pelo CV.
    Documentos da contabilidade do tráfico apreendidos registram a movimentação de R$ 1 milhão por mês nas bocas de fumo da favela da Reta, que tem 25 mil habitantes.
    "A facção transformou aquele local em sua base. Abrigam fugitivos dos morros ocupados na capital e distribuem drogas", afirma o delegado Wellington Vieira, da Divisão de Homicídios.
    O local pode ter sido escolhido por ficar longe do projeto das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), que já se instalou em 34 favelas no Rio, mas não tem previsão de ser implantado fora da capital.
    Na favela, os traficantes montaram barreiras para dificultar o acesso. Armados, patrulham a área em motos.
    Em julho, tentaram resgatar um de seus chefes, que está num presídio federal e era levado para depor na Justiça. Um agente penitenciário acabou morto por tiros de fuzil.
    "A violência em Itaboraí cresceu bastante com as armas que chegaram na favela", disse o juiz Marcelo Villas, que atuou na cidade.

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