terça-feira, 4 de março de 2014

Não foi brincadeira [minha história] - Johanna Nublat

folha de são paulo
MINHA HISTÓRIA
Não foi brincadeira
Levado por engano em van escolar roubada em Brasília, menino de 11 anosconta como se escondeu e conseguiu fugir dos bandidos
RESUMO João (nome fictício), 11, estava numa van escolar quando dois criminosos anunciaram o roubo do veículo. O garoto se escondeu no fundo da perua com outra criança, e, por meia hora, os dois circularam com os criminosos por uma cidade-satélite de Brasília até conseguirem escapar da van. O menino, surpreendentemente articulado para uma criança de sua idade, contou ontem os detalhes da fuga espetacular.
(...) Depoimento a
JOHANNA NUBLATDE BRASÍLIAEu saí do colégio [anteontem], era um dia comum, [a van escolar] tinha deixado grande parte dos alunos.
Quando a van parou numa esquina, dois bandidos chegaram e mandaram o motorista descer. Nessa hora, a gente entendeu que tinha alguma coisa diferente.
A única reação que eu e a garota [também de 11 anos, que ficou na van roubada] tivemos foi a de nos abaixar no último banco para que os bandidos não nos vissem. Pensamos que, quando eles dessem bobeira, a gente poderia sair.
Só um estava armado. Eles continuaram dirigindo, rápido, falavam bastante palavrão e brigavam. Um perguntava se tinha alguém atrás e o outro respondia que não.
Ficamos com muito medo, principalmente na hora que um deles deixou a arma cair. Eu estava agachado. Ele pegou e balançou a arma.
Em alta velocidade, entrando na contramão, ele pegou a BR e virou num balão que dava num núcleo rural.
Quando eles abordaram a van, joguei meu celular embaixo do banco, porque pensei que era um assalto --que eles pegariam as coisas e iriam embora. Só que eles pegaram a van, e vi que foi uma besteira ter jogado meu celular lá embaixo.
Quando chegaram numa área escura, eles pararam e desceram. Eu fui atrás do meu celular para poder falar com a minha mãe ou com a polícia. Meu celular estava ligado, com som e a luz [da tela] no máximo.
Quando peguei o celular e estava voltando para o banco de trás, consegui colocar no silencioso e diminuir a luz da tela. Então um dos ladrões voltou e vasculhou uns folhetos.
Quando ele saiu de novo, consegui ligar para minha mãe e falar que a van tinha sido roubada com a gente dentro em Sobradinho dos Melos [a cerca de 20 km da Esplanada]. Eu já sabia mais ou menos me orientar por lá.
Minha mãe falou: "Fica dentro da van e deixa na ligação". Mas, no nervosismo, ela desligou o telefone.
Minha colega estava nervosa e chorava às vezes. Eu falei :"Vamos sair daqui". A gente não sabia onde os ladrões estavam, mas era melhor a gente sair do que ficar lá dentro e eles voltarem.
Fomos subindo em direção à BR. Tinha uma pista de terra e muito mato, sem luz. Carros passavam em alta velocidade. A gente chegou no meio do caminho e ela pediu para voltar e pegar a mochila.
Eu disse: "Não, esquece da mochila, agora a gente tem que se salvar". Minha mãe sempre me falou: "Esquece tudo, vai embora e cuida da sua vida. Bens materiais você pode deixar para trás, só preserve a vida".
Eu estava procurando um modo de escapar dali. A gente pediu ajuda para motoristas, e ninguém parava.
Um cara parou e perguntou o que faziam duas crianças sozinhas, caminhando na escuridão. E ele nos levou para a delegacia.
Minha mãe ligou para o coronel do batalhão do Paranoá, e ele me ligou. Eu já estava fora da van.
Na delegacia, o policial me chamou para vasculhar o local e encontrar a van. Quando a gente chegou, ela não estava mais lá. A gente teve que rodar a área rural inteira. Até que a gente conseguiu achar a van, em um desmanche, do lado de uma escola e de uma igreja.

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