quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Janio de Freitas

folha de são paulo
Entre os poderosos
A consagração a Mandela em sua morte ressalta, por contraste, a falta de estadistas no mundo atual
A consagração a Mandela em sua morte ressaltou mais do que o valor já reconhecido em vida a esse ser extraordinário. Silenciosa, em meio ao tanto que foi dito e entre todos os que representaram poderes e povos a homenageá-lo, esteve em tudo a evidência, por contraste, da falta de estadistas no mundo atual. Isto foi o Mandela pranteado: estadista.
Quem, entre tantos detentores dos poderes, causaria hoje no mundo, não só um possível choque com a notícia súbita de sua morte, mas uma comoção sincera, a atmosfera de empobrecimento difuso, a percepção inconsciente de que uma ausência distante no planeta nos prova o quanto, no mais fundo de nós, somos e nos sentimos próximos --quem?
OUTROS MORTOS
Um mérito está assegurado, antes de qualquer discussão, ao relatório da Comissão Municipal da Verdade de São Paulo que afirma a morte de Juscelino Kubitschek por assassinato: provoca a retomada, em ambiente afinal favorável, desse caso repleto de imprecisões e suspeitas desde o primeiro momento. Com o reexame da morte de João Goulart, já em curso, talvez os dois gerem força capaz de fazer com que a morte de Carlos Lacerda seja estudada nos seus muitos mistérios.
O noticiário módico, em comparação com a quase centena de provas e indícios relatados, não dá ideia da firmeza do material e das conclusões da comissão. Não há dúvida, porém, de que inova em uns e renova outros questionamentos importantes. Mais uma comprovação de que a perícia e as alegadas investigações em 1996, quando dos 20 anos da morte de Juscelino, ficaram muito aquém do necessário para respostas confiáveis, em um ou em outro sentido.
A família de Carlos Lacerda, contrariamente às de Juscelino e Jango, jamais aderiu a propostas de esclarecimento da estranha e rápida doença fatal que o acometeu, com apenas 63 anos, em maio de 1977. Mas o assunto, hoje, já deixou de ser político e, tanto quanto familiar ou ainda mais, é da história. Tudo indica que essencial para a história da ditadura e seus crimes.
DE PRESENTE
O Ministério Público de São Paulo ficou muito mal no caso, que atinge o PSDB, de altas compras para o metrô e trens paulistas. E sua defesa o deixa pior.
Como relatou o repórter Mario Cesar Carvalho (Folha, 8/12, "Testemunha nas sombras"), a promotora Beatriz Lopes de Oliveira rebate as acusações de incompetência do MP com o argumento de que o denunciante do cartel Siemens/Alstom "dizia ter provas, mas nunca apresentou nada", lá por 2010. "Sem provas", diz a promotora, "nenhum juiz concederia uma autorização de busca ou escuta telefônica".
Tais autorizações são exatamente para coletar provas. Para concedê-las, os juízes exigem razões convincentes. E não constou, jamais, que a competência e a eficiência de promotores dependessem de ganhar provas.
A denúncia já era um grande presente, que o Ministério Público não utilizou, seja lá pelo que for.

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