sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Crítica 'Lobo de Wall Street' André Barcinski gostou, Agabiti Fernandez não gostou

folha de são paulo

CRÍTICA GOSTEI
Corajoso e bem escrito, filme deveria ganhar tudo no Oscar
ANDRÉ BARCINSKIESPECIAL PARA A FOLHA
Martin Scorsese sempre gostou de personagens solitários em conflito com o sistema ou com seus demônios pessoais. Seja o motorista de "Taxi Driver", o boxeador em "Touro Indomável", Howard Hughes em "O Aviador" ou o policial vivido por Leonardo DiCaprio em "Os Infiltrados", o típico protagonista de Scorsese batalha sozinho contra um mundo hostil.
Em "O Lobo de Wall Street", o cineasta cria mais um desses Quixotes modernos: Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio), um corretor de Wall Street que fica milionário nos anos 80 com práticas antiéticas e ilegais e desafia a polícia, a Bolsa e o FBI.
Belfort poderia muito bem ser um popstar: cheira montanhas de cocaína, bebe rios de uísque e vive cercado de prostitutas caríssimas. A analogia não é absurda: nos anos 80, magnatas de Wall Street eram verdadeiros popstars.
Belfort tem um iate que mais parece um navio, arremessa lagostas em agentes do FBI e joga dinheiro ao vento. Parece gostar mais de poder que de dinheiro.
Para um personagem de excessos, Scorsese fez um filme de excessos: "O Lobo" é longo, barulhento, acelerado e tem um humor negro e ácido. É o filme mais engraçado da carreira do cineasta.
Belfort e seu parceiro, Donnie Azoff (o sensacional Jonah Hill) parecem uma versão alucinada do Gordo e o Magro. Há uma cena de overdose de sedativos que já entrou para a antologia de psicopatas fora de controle, junto com Tony Montana enfiando a cara na montanha de pó ou o Frank Booth cheirando gás em "Veludo Azul".
"O Lobo de Wall Street" merecia ganhar tudo no Oscar. É um filme corajoso, absurdamente bem escrito (por Terence Winter, roteirista de "Os Sopranos" e "Boardwalk Empire") e sem medo de pecar pelo excesso. Um grande momento de Scorsese e o maior de Leonardo DiCaprio.
O LOBO DE WALL STREET
DIREÇÃO Martin Scorsese
PRODUÇÃO EUA, 2013
ONDE Kinoplex Vila Olímpia, Pátio Paulista Cinemark e circuito
CLASSIFICAÇÃO 18 anos
AVALIAÇÃO ótimo
CRÍTICA NÃO GOSTEI
Scorsese apresenta ofensiva e longa sucessão de vulgaridades
ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZCOLABORAÇÃO PARA A FOLHAA filmografia de Martin Scorsese está repleta de personagens perturbados e excessivos, inseridos em um conjunto de relações de força e dominação a serviço de suas próprias perversões.
O personagem central de "O Lobo", o corretor de títulos da bolsa de valores de Nova York, Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio), tem todas as características para figurar nesta galeria de tipos.
Adaptado de um livro de Belfort, o filme é o retrato da ascensão e queda de um canalha ávido e cheio de lábia, guiado apenas pela cupidez. Belfort fez fortuna enganando pequenos poupadores.
Movido a sexo, ambição e quantidades descomunais de drogas, Belfort galvanizava os vendedores de sua corretora com discursos inflamados sobre suas técnicas de venda pra lá de agressivas esgrimindo a promessa de rápidos e fabulosos ganhos.
Ostentatório e hedonista, o estilo de vida --pontilhado de mansões nababescas, helicóptero, iate, carrões, festas orgiásticas com prostitutas de luxo-- foi erigido como modelo pelos jovens corretores.
Belfort foi condenado a quatro anos de prisão. Como delatou companheiros, passou só 22 meses atrás das grades, onde escreveu dois livros autobiográficos. A renda obtida com os livros, os direitos do filme e as palestras sobre sua técnica de vendas serve para reembolsar investidores.
Durante três horas, Scorsese apresenta uma longa sucessão de vulgaridades que se revela ofensiva e monótona.
O diretor não tem distanciamento em relação ao ubíquo personagem, lançando-lhe um olhar no limite da complacência. A parcialidade fica clara quando se constata que os personagens secundários são meros bufões e que as vítimas de Belfort brilham pela ausência.
O cineasta quase se redime na perturbadora cena final, um convite à reflexão sobre a natureza humana, ao mostrar uma plateia de bocós ouvindo uma palestra de Belfort: tais espectadores somos nós, o público, um bando de cobiçosos extasiados pela saga de um tipo repugnante.

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