domingo, 22 de dezembro de 2013

Ministro promete rapidez para mensalão do PSDB - Entrevista Luis Roberto Barroso

folha de são paulo
ENTREVISTA - LUÍS ROBERTO BARROSO
Inércia do Congresso é risco à democracia e obriga STF a atuar
PARA MINISTRO, DECISÃO DO SUPREMO SOBRE DOAÇÕES ELEITORAIS PODE LEVAR LEGISLATIVO A RETOMAR DEBATE SOBRE REFORMA POLÍTICA
FERNANDO RODRIGUESDE BRASÍLIA
"A inércia do Congresso traz riscos para a democracia. E proteger as regras da democracia é um papel do Supremo", afirma o ministro Luís Roberto Barroso, explicando a razão de o Poder Judiciário ter começado a julgar há duas semanas se doações de empresas em campanhas eleitorais são inconstitucionais.
Em entrevista à Folha e ao UOL, o mais novo integrante do STF (Supremo Tribunal Federal), que tomou posse no fim de junho, diz compreender a paralisia do Congresso quando se trata de reformar o sistema político. "Há muita dificuldade de se formarem consensos. Não querem mudar a lógica do jogo que os ajudou a chegar lá", afirma.
O STF começou a julgar no início deste mês uma ação direta de inconstitucionalidade proposta pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Se ela for aceita, serão proibidas as doações eleitorais de empresas, que hoje respondem por mais de 80% do que é arrecadado pelos candidatos.
Até agora, 4 dos 11 ministros do STF já se manifestaram a favor da proibição. O julgamento foi suspenso e será retomado no ano que vem.
Barroso votou contra as doações das empresas e acha que a função principal desse julgamento é fomentar o debate sobre reforma política. "Não está funcionando, nós temos que empurrar a história. Está emperrado, nós temos que empurrar", diz. "Espero que a decisão do Supremo recoloque essa questão na agenda do Congresso."
A seguir, trechos da entrevista de Barroso, concedida na quarta-feira, em Brasília.
-
Folha/UOL - O sr. votou a favor de considerar inconstitucional a doação de empresas privadas para políticos em campanha eleitoral. Como deveria ser o modelo de financiamento, então?
Luís Roberto Barroso - Em tese, não considero inconstitucional em toda e qualquer hipótese a doação por empresa. Mas no modelo brasileiro grandes empresas doam para o partido A, para o partido B, para o partido C.
Não tem nada a ver com ideologia. Doam ou por medo, ou porque são achacadas, ou porque querem favores. No sistema que nós temos, a derrama de dinheiro produz um impacto antidemocrático e antirrepublicano.
É possível prescindir das doações diretas de empresas?
É possível. Ou é até possível desenhar um modelo em que a doação de empresas não tenha este impacto deletério sobre o princípio republicano e sobre a moralidade pública.
O Congresso, pressionado pelas multidões que tinham ido para as ruas, discutiu a reforma política.
Não saiu nada...
Logo que o povo saiu da rua essa agenda foi desarticulada. Espero que a decisão do Supremo recoloque essa questão na agenda do Congresso. Acho que decisão política tem que tomar quem tem voto. Agora, a inércia do Congresso traz riscos para a democracia. E proteger as regras da democracia é um papel do Supremo.
O sr. acha que o Congresso tem sido inerte por quê?
Porque há muita dificuldade de se formarem consensos. Compreensivelmente --faz parte da natureza humana-- não querem mudar a lógica do jogo que os ajudou a chegar lá.
O Congresso Nacional não avança nessa área.
Foi uma pena. Aquela energia cívica que foi o povo nas ruas foi formidável. É a energia que move a história. É assim que se produzem as grandes transformações.
Mas, para fazer andar a história, não precisa estar com o povo gritando atrás. É preciso interpretar e fazê-la andar. Está ruim, não está funcionando, nós temos que empurrar a história. Está emperrado, nós temos que empurrar.
O sr. tem opinião sobre a criminalização do uso de drogas?
Acho que a criminalização de drogas leves é uma má política pública. A criminalização da maconha é uma política pública equivocada. Estou preocupado com o impacto dessa atividade criminosa sobre as comunidades que são dominadas pelas pessoas que fazem o tráfico.
Seria uma política pública boa, ou pelo menos uma boa experiência que não produzirá nada pior do que o que a gente já tem, a descriminalização da maconha.
Descriminalizar a maconha resolveria o problema dessas comunidades?
Vejo quantos casos chegam às minhas mãos de pessoas condenadas por tráfico, por pequenas quantidades de maconha: 100 gramas, 200 gramas, 500 gramas.
Isso provoca um impacto extremamente negativo. Vai preso por 250 gramas de maconha e sai violentado, embrutecido e pronto para crimes mais graves. Do ponto de vista de uma política criminal, não teria nenhuma dúvida de que descriminalizar a maconha é positivo.
Mas como é possível distinguir entre o que deve ser descriminalizado?
O país precisa de um debate sem preconceitos. Do meu ponto de observação, é uma má política pública prender dezenas de milhares de jovens por tráfico de pequenas quantidades de maconha e mesmo, eventualmente, de cocaína quando não estejam associadas a outro tipo de delinquência.
O que acha da política do Uruguai de liberar drogas leves --no caso, a maconha?
Tenho simpatia pela experiência. Acho que a gente deve observá-la. No Brasil, as pessoas acham muito sem terem procurado. Não sou uma dessas pessoas.
ANÁLISE - JUDICIÁRIO
Supremo não abre mão do poder que acumulou
Corte está dividida entre ministros que desejam respeitar o espaço do Congresso e outros que pretendem avançar
NESTE ANO O STF TERIA JULGADO 89.565 PROCESSOS, MAIS DE 8.000 POR MINISTRO; DIFÍCIL ACREDITAR QUE LERAM TODOS
JOAQUIM FALCÃOESPECIAL PARA A FOLHAComo foi o Supremo Tribunal Federal em 2013? Pergunta simples, resposta complexa. São múltiplos Supremos.
Existe o Supremo como última instância do Judiciário. Neste ano o Supremo teria julgado 89.565 processos, contra 90.044 processos no ano passado --mais de 8.000 por ministro da corte.
Difícil acreditar que os ministros puderam ler individualmente todos os processos. Se são julgamentos repetitivos, não precisariam ir ao Supremo.
Por anos se acreditou que esse exagero era desordem organizacional, excesso de recursos. Não é.
Cada dia fica mais claro que é uma questão de poder. O Supremo não quer abrir mão de nada. Para ninguém. Nem para os tribunais estaduais, ou superiores. É excesso de concentração de poder.
Nem o Supremo se une a favor de legislação que lhe reduza os recursos, como no caso da Emenda Peluso. Nem toma outra iniciativa de fazê-lo. Ativismo quantitativista.
O Brasil fica à espera do dia que o Supremo resolva pinçar um processo, colocar na pauta e julgá-lo. Usar a espada Suprema. Das 41 Adins (ações diretas de inconstitucionalidade) contra o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), por exemplo, o Supremo em geral concede liminar, mas não julga o mérito. Cria assim imprevisível ordem jurídica de conjunturas.
O outro Supremo é o da sintonia com os cidadãos. Tem muito avançado e na direção certa. Até o mensalão o Supremo nunca havia condenado à prisão em definitivo alguém com foro privilegiado. Agora não mais.
Enfrentou também casos importantes, como royalties, a inconstitucionalidade do regime de precatórios, a criação de novos partidos políticos. Escolher a pauta é a principal espada do Supremo.
Como agirá em 2014? Processos sobre regras eleitorais e econômicas deverão ser prioritários.
Finalmente, o último Supremo é o Poder da República diante do Congresso e Executivo. Temos visto um Supremo inquieto, de ministros divididos. Uns querendo respeitar o espaço congressual, outros querendo avançar.
O receio de surgir um Supremo expansionista está se tornando rotina nos julgamentos. É preciso que o Supremo se apazigue.
Em 2014 um Congresso Nacional novo, legitimado pelo voto, será eleito. Na democracia o voto deve ser maior do que a espada interpretativa do Supremo. Autolimitar-se seria prudente.
O SUPREMO NÃO QUER ABRIR MÃO DE NADA. PARA NINGUÉM. É EXCESSO DE CONCENTRAÇÃODE PODER
    Ministro promete rapidez para mensalão do PSDB
    Relator do caso, Barroso diz que voto estará pronto no primeiro semestre
    Data do julgamento vai depender do voto do revisor, Celso de Mello, e da pauta prevista para o STF no próximo ano
    DE BRASÍLIARelator do mensalão tucano, o ministro Luís Roberto Barroso aguarda apenas terminar a fase de alegações finais, ainda este ano, para preparar a parte que lhe cabe no processo. "Sou relativamente rápido. Tudo estando pronto na volta do recesso, imagino que em meados do primeiro semestre meu voto esteja pronto", disse ele em entrevista àFolha e ao UOL.
    O mensalão tucano é um caso de uso de dinheiro não declarado para financiar campanhas eleitorais, tendo como principal acusado o deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que já foi presidente nacional da sigla.
    Na disputa entre PT e PSDB, os petistas sempre se queixam de terem enfrentando o julgamento de seu mensalão antes que o caso dos tucanos fosse apreciado pelo Supremo Tribunal Federal.
    Segundo Luís Roberto Barroso, entretanto, não há como prever com precisão quando o caso envolvendo o PSDB chegará a um desfecho. Eis como o ministro descreve o rito a ser seguido agora:
    "Não depende só de mim. O processo está em alegações finais. É a ultima manifestação do acusado, depois de ouvidas todas as testemunhas e produzidas todas as provas. Aí o processo vem concluso para mim, elaboro o meu voto, em seguida encaminho para o ministro Celso de Mello, que é o revisor. Portanto, vai depender de eu preparar o meu voto, do ministro Celso de Mello preparar o dele, e da presidência pautar para julgar."
    A única certeza é sobre o voto de Barroso no início de 2014. Depois, entra-se em um cronograma cheio de imprevisibilidades jurídicas. "A gente deve prever o que está sob o nosso controle. Existem outros atores importantes. Existem alguns componentes aleatórios, como a própria pauta do Supremo ao longo de 2014", afirma o ministro.
    No caso do mensalão do PT, Barroso diz preferir não comentar a atual fase de execução das penas de partes do condenados. A primeira fase do julgamento, em que as condenações foram definidas, foi concluída em 2012.
    "Se eu achasse alguma coisa relevante sobre esse assunto eu diria internamente, e não publicamente. Tenho uma postura de não fazer juízos públicos sobre votos ou posições dos meus colegas."
    Quando ainda era advogado, Barroso defendeu a causa do italiano Cesare Battisti, que obteve direito de permanecer no Brasil, mesmo tendo sido acusado de assassinato na Itália. Indagado sobre semelhanças com o caso do norte-americano Edward Snowden, que participou do vazamento de documentos secretos dos EUA e tenta obter asilo em outros países, o ministro diz que são episódios diferentes.
    "Mas se o Brasil desse asilo a ele e eu ainda fosse advogado, eu o defenderia também", afirma. Simpatiza com a causa? "Não, eu simpatizo com a defesa."

      Nenhum comentário:

      Postar um comentário